PINDAMONHANGABA – “Já não posso mais.” Com estas quatro palavras, escritas numa letra vacilante no dorso de um volante da Loteria Esportiva, dona Carochinha se despediu do mundo. O seu corpo foi encontrado nas margens do Ribeirão Grande, onde se atirou na madrugada de ontem, aos 78 anos de idade.
Vizinhos contam que dona Carochinha vinha dando sinais progressivos de depressão. “Quando, na semana passada, ela foi à agência da Caixa Econômica, banco do qual era cliente desde 1954, e o gerente lhe disse não acreditar que ela tivesse conta ali, dona Carochinha decidiu que não valia mais a pena insistir”, conta Nataniel Wromsbky, 80 anos, um conhecido. Dona Carochinha desfaleceu em frente ao caixa, mas a ambulância só apareceu quatro horas depois, “pois eles acharam que ela estava fazendo fita”.
Há anos dona Carochinha vinha enfrentando problemas semelhantes. Desde 1998 não conseguia abrir um crediário, pois ninguém acreditava nos comprovantes de renda que apresentava. Em consequência, passou a última década sem liquidificador, batedeira, rádio e aspirador de pó. Desistiu de pedir emprestado a vizinhos e parentes pois, quando dizia, "Devolvo já, juro", ninguém acreditava.
Em 2007, seu seguro-saúde foi cancelado sob o argumento de que Carochinha mentira a respeito da idade. “Ela nos disse que tinha 76 anos, mas conseguimos convencer o juiz que ela parecia ter no mínimo uns seis meses a mais”, contou o advogado Demósthenes Serapião, que representou a seguradora. De nada adiantou dona Carochinha apresentar suas certidões de nascimento, batismo, crisma e casamento, o RG, o CPF e o título de eleitor, pois o juiz da Terceira Comarca de Pindamonhangaba julgou os documentos “suspeitos” e dispensou a perícia técnica.
Dona Carochinha foi enterrada como indigente. Ao saber do bilhete de despedida, o coveiro José Alexandrino foi cético: “Ela podia mais sim.”
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