terça-feira, abril 21, 2009

O Castelo Branco

Primeiro romance de Orhan Pamuk, 'O castelo branco' conta a história de um acadêmico veneziano aprisionado pelos turcos no século XVII. Graças aos seus conhecimentos, o italiano escapa do chicote e dos remos da esquadra, mas acaba vendido em uma feira de escravos e, depois de ser comprado por um paxá, é dado de presente a Hoja, um estudioso turco. Quando amo e escravo se encontram, um choque - os dois homens são tão parecidos entre si que chegam a se confundir. Sem nunca abandonar a esperança de voltar à terra natal, o veneziano ensina a Hoja tudo o que aprendera em seu país, e os dois ainda investigam alguns fenômenos naturais. Até que o mestre fica obcecado por uma pergunta; o que faz de nós o que somos? Sem ter uma resposta exata, o escravo procura as pistas, e os dois concluem que a chave dessa questão de identidade está nos sonhos e nos pecados de ambos. Eles então se dedicam a uma longa expiação, na qual narram em pormenores todos os acontecimentos de suas vidas. A intrincada tapeçaria da trajetória dos dois, de obscuros curiosos de província a conselheiros diretos do sultão da Turquia, encobre um estudo delicado e complexo das relações entre a Europa e a Turquia. Mas a principal investigação de Pamuk nesta narrativa fluida e criativa é sobre a questão ancestral que perturba o Hoja e ecoa em todos nós - o que, afinal, forma a nossa identidade e define quem somos?

Trecho:

Ele concordou que é preciso buscar o estranho e o inesperado,como na minha história. Sim, talvez isso fosse a única coisa que pudéssemos fazer para combater o tédio cansativo deste mundo, pois ele sabia disso desde os monótonos dias da infância e da escola, e jamais considerara a possibilidade de fechar-se entre quatro paredes; por isso mesmo, passara a vida inteira viajando, procurando histórias em caminhos que pareciam não ter fim. Mas há que buscar o bizarro e o extraordinário no mundo externo e não dentro de nós mesmos!Investigar para dentro, pensar tão longamente,tão minuciosamente sobre nós mesmos, apenas nos faria infelizes. Fora isso o que acontecera com as personagens da minha história. Por essa razão os heróis jamais toleraram ser eles mesmos, por essa razão eles sempre quiseram ser outras pessoas. Suponhamos que o que relatei na minha história tivesse de fato acontecido. Poderia eu acreditar que aqueles dois homens que tomaram o lugar um do outro pudessem ser felizes nas suas novas vidas? Não respondi. Depois, por este ou aquele motivo, ele me recordou um pormenor da história: não nos podemos deixar seduzire induzir em erro pelas esperanças de um escravo espanhol de um braço só! Se o fizermos, a pouco e pouco, escrevendo esse tipo de contos, procurando o que há de estranho em nós mesmos, nós também nos tornaríamos outras pessoas e, Deus não o permita, o mesmo poderia acontecer com os leitores! Ele não queria nem pensar no que seria do mundo se os homens falassem sempre deles mesmos, das suas peculiaridades, se seus livros e histórias tivessem sempre isso como tema.



Entrevista The Paris Review

INTERVIEWER

Let’s go back to before The Black Book. What inspired you to write The White Castle? It’s the first book where you employ a theme that recurs throughout the rest of your novels—impersonation. Why do you think this idea of becoming somebody else crops up so often in your fiction?

PAMUK

It’s a very personal thing. I have a very competitive brother who is only eighteen months older than me. In a way, he was my father—my Freudian father, so to speak. It was he who became my alter ego, the representation of authority. On the other hand, we also had a competitive and brotherly comradeship. A very complicated relationship. I wrote extensively about this in Istanbul. I was a typical Turkish boy, good at soccer and enthusiastic about all sorts of games and competitions. He was very successful in school, better than me. I felt jealousy towards him, and he was jealous of me too. He was the reasonable and responsible person, the one our superiors addressed. While I was paying attention to games, he paid attention to rules. We were competing all the time. And I fancied being him, that kind of thing. It set a model. Envy, jealousy—these are heartfelt themes for me. I always worry about how much my brother’s strength or his success might have influenced me. This is an essential part of my spirit. I am aware of that, so I put some distance between me and those feelings. I know they are bad, so I have a civilized person’s determination to fight them. I’m not saying I’m a victim of jealousy. But this is the galaxy of nerve points that I try to deal with all the time. And of course, in the end, it becomes the subject matter of all my stories. In The White Castle, for instance, the almost sadomasochistic relationship between the two main characters is based on my relationship with my brother. On the other hand, this theme of impersonation is reflected in the fragility Turkey feels when faced with Western culture. After writing The White Castle, I realized that this jealousy—the anxiety about being influenced by someone else—resembles Turkey’s position when it looks west. You know, aspiring to become Westernized and then being accused of not being authentic enough. Trying to grab the spirit of Europe and then feeling guilty about the imitative drive. The ups and downs of this mood are reminiscent of the relationship between competitive brothers.


O Castelo Branco, Orhan Pamuk, p. 156

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