Hamlet: Shakespeare x Freud
Um ponto de complexos
“Illudunt nobis conjucturae nostrae, quarum nos pudet, posteaquam in meliores codices incidimus”[1].
Scaligei a Salmasius, Espitolae 1627, espitola CCXLVII
O Complexo de Freud.
“Em Hamlet, de fato, o conflito está tão oculto que coube a mim desvenda-lo”[2].
Freud
O texto em que Freud faz essa profecia a respeito de si mesmo é de 1905/1906, depois de ter erigido Édipo como chave dos mistérios e a si mesmo como chaveiro com a Interpretação dos Sonhos.
O decifrador da Esfinge busca as soluções para outra esfinge, o fantasma de Hamlet, para se descobrir à solução desse enigma fantasmagórico, ele quer pesquisar outro fantasma, o fantasma do próprio Shakespeare.
O meio para a solução do espírito de Shakespeare e de Hamlet, de tamanho mistério seria a obra de Freud: o Édipo.
Ele surge como chave decifradora de todos os enigmas do intelecto e da vida humana. E nessa questão, eis o seu símbolo de maior expressão no teatro, o personagem mais enigmático de todos, Hamlet.
O diagnostico freudiano colocou Hamlet como neurótico, ou um melhor:
... um homem ate então normal torna-se neurótico devido a natureza particular da tarefa com se defronta, ou seja, um homem em quem uma moção ate ali recalcada com êxito esforça-se por se impor[3].
Continua Freud sua prescrição da solução da psique hamletiana distinguindo nela três características principais:
(1) O herói não e um psicopata, transformando-se em tal apenas no decorrer da ação. (2) A moção recalcada figura entre as que são igualmente recalcadas em todos nos; seu recalcamento faz parte das bases de nosso desenvolvimento pessoal, e justamente ele quem a situação da peça vem contestar. Essas duas características facilitam que nos reconheçamos no herói; somos susceptíveis ao mesmo conflito que ele, pois ‘quem não perde a razão nessas circunstancias não tem razão nenhuma a perder. (3) Mas parece precondição desse modelo artístico que a moção que luta por chegar a consciência, por mais notória que se revele, não seja chamada por seu próprio nome; assim, o processo consuma-se de novo no espectador, com sua atenção distraída, e ele se torna presa de sentimentos, em vez de se aperceber do que esta acontecendo. Poupa-se desse modo, sem duvida, uma certa dose de resistência, tal como a que encontramos no trabalho analítico, onde os retornos do recalcado, por provocarem uma resistência menor, chegam a consciência, ao passo que o próprio recalcado não consegue faze-lo[4].
Nesse sentido, tempos atrás viu Samuel Johnson para ele no palco de Shakespeare “as imitações causam dor ou prazer; não porque nos recordam a realidade. Quando a imaginação se delicia com uma paisagem pintada, não julgamos que as arvores nos dêem sombra, ou as fontes do refrigério, mas pensamos como seria agradável estar diante dessas fontes borbulhantes e bosques oscilantes como esses”[5]·.
O transporte espaço-temporal, no fundo se trata de um transporte psíquico, num ato de sedução, num sub ducere, num conduzir por baixo da consciência, que Shakespeare impõe a seus espectadores atentos.Stendhal, diz que no teatro “o fato e que o espectador, atraído pela ação, não se surpreende com nada; ele absolutamente não se da conta do tempo percorrido[6]”.
Mas para onde se levam os espectadores? Para onde caminha a dramaturgia shakespeariana, que sua obra labora no ser dos seus seduzidos. Samuel Johnson insiste que “o evento que ele representa não se realizara”.
Em seu “Ensaio Autobiográfico”, Freud continua a saga profilática da mente de Hamlet-Shakespeare.
Para essa profilaxia da mente de Hamlet e explicar as razoes do seu imobilismo factual Freud estende para alem de Hamlet a três características para toda obra literária, surge Hamlet como paradigma da criação artística, onde o autor conduziria o espectador na progressão do recalcamento.
Hamlet possui um conflito interno que ficou desde sua primeira aparição publica negada sua resolução a platéia, a chave do mistério, que desvendaria o porque de tanto imobilismo frente a Claudius e a mãe adultera ficou negado ao publico, que só tem acesso a ele, num recalcamento em si mesmo, e nunca consegue conjugar representativamente tais motivos tão ocultos.
Freud vem trazer luzes para esse enigma, colocando sua descoberta do mecanismo da psique humana, o Complexo de Édipo na vida mesma de Shakespeare, ou melhor, do Duque de Oxford.
A luz é tomada emprestada de J.T. Looney, que em sua obra de 1920, “Shakespeare Identified”, identifica Shakespeare como sendo um tal duque ou conde de Oxford, de nome Edward de Vere, um sujeito que havia perdido o pai um ano antes da escritura de Hamlet.
O que Shakespeare, na aurora do outono de 1897, havia dado luzes numa carta a Fliess, quando “ele menciona por alto a sua descoberta, mas num tom confiante: ‘Me ocorreu de passagem’, escreveu, que o conflito edipiano retratado por Sófocles em Édipo Rei poderia ‘ também estar no fundo de Hamlet. Não estou pensando na intenção consciente de Shakespeare’, acrescentou, ‘mas acredito, sim, que um acontecimento real estimulou o poeta a fazer uma descrição, dizendo mesmo, uma vez que o seu inconsciente compreendia perfeitamente o inconsciente do herói. Como histérico Hamlet justifica a frase: “Assim, a consciência torna covardes a nos todos?” Como ele explica a sua hesitação em vingar a morte do pai, assassinando o tio – Hamlet, o mesmo sem hesitar envia os seus cortesãos para a morte, e que é indubitavelmente precipitado ao assassinar Laertes?’ Hamlet, concluiu, devia estar atormentado pela memória obscura de ter alimentado desejos homicidas contra o próprio pai”[7].
Na mesma pagina Peter Gay expõe o erro da afirmação freudiana, quanto à pretensa não-hesitação hamletiana diante de outros objetos não-relacionados à figura do pai ou materna, Hamlet, mata a Polônio, pai de Laertes, Peter Gay termina sua nota numa reconciliação a temática edipiana, falando que Freud tão emaranaranhado num véu edipiano, não conseguiu enxergar ou encarar a enormidade da hostilidade edipiana que o filho dirige contra o pai.
James T. Looney, o autor que deu a identidade que Freud precisara, veio tarde para Freud, pois a busca por um Shakespeare com motivos inconscientes, um outro alem do ator de Stratford começara muito antes.
A primeira concepção em alta nos círculos freqüentados da época era que Shakespeare era Francis Bacon, dela acordava Meynert, Freud contra essa hipótese argumentou que:
“se fosse assim, Bacon teria sido o cérebro mais poderoso que o mundo já produziu, enquanto que na minha opinião , eh preciso dividir as realizações de Shakespeare entre diversos rivais, ao invés de sobrecarregar um outro homem importante com elas.[8]”
Há mais uma hipótese, convencido através de retratos do homem enigma, sem identidade agora, Freud assegura-se dos traços latinos de Shakespeare e chega a adotar tese que ele seria um tal de Jacques Pierre.
Sobre tal, ironiza Harold Bloom nos dizendo que:
“Rejeitando a tese baconiana, Freud pegou todas as outras idéias esquisitas postas em circulação sobre e contra Shakespeare, incluindo a sugestão de um acadêmico italiano de que o nome era a versão de Jacques Pierre!”[9]
Por fim, nos idos de 1926 Freud identifica a verdadeira perssona de Shakespeare, em Shakespeare Identified de J. Thomas Looney, no começo ele assumia timidamente a idéia que Edward de Vere fosse Shakespeare. No discurso de recebimento do Premio Goethe ele nos diz que:
“É inegavelmente embaraçoso para nos todos não saber ainda quem e o autor das comedias, das tragédias e dos sonetos de Shakespeare, se ele foi realmente o filho ignorante de um pequeno burguês de Stratford, que obteve uma modesta posição de ator em Londres, ou se ele foi o aristocrata levemente declasse e ardentemente dissoluto, de origem nobre e educação requintada, Edward de Vere, décimo sétimo conde de Oxford, e Lord Great Chamberlain, hereditário da Inglaterra.”[10]
Aqui, parece aquele recurso teórico da falsa pergunta, a pergunta que já contem em si a resposta, ou como Freud gosta, a coisa que explica a si mesma, a resposta que já estava embutida.
Num outro lance de pensamento anterior ao discurso na casa Goethe, sua posição já era mais explicita em favor da hipótese looneyana, numa nota a Interpretação dos Sonhos de 1928, ele diz que perdera a fé na suposição que homem de Stratford fosse realmente Shakespeare.
Já havia em Freud uma tendência a negar a realidade de Shakespeare, como filho de um fabricante de luvas,em 1935 veio a consagração da presença de Looney na mente de Freud. Para afirmar que não fora Shakespeare havia escrito Hamlet logo após a morte do pai, Freud fortalece em uma nota de rodapé a hipótese do Duque de Oxford.
O texto base da nota de rodapé é a seguinte afirmação escrita em 1925,1926, esta no “Um Estudo Autobiográfico.
“Hamlet, objeto de admiração por trezentos anos, sem que seu significado tivesse sido descoberto ou os motivos de seu autor adivinhamos. Mal poderia haver a possibilidade de que essa criação neurótica do poeta viesse a malograr, como seus inúmeros companheiros da vida real, sobre o complexo de Édipo; e diante daquela tarefa seu braço ficou paralisado pelo próprio obscuro sentimento de culpa. Shakespeare escreveu Hamlet logo após a morte de seu pai”.
Sobre essa ultima sentença dessa cadeia argumentativa que nasce a conturbada nota a seguir transposta.
“Esta é uma interpretação que gostaria explicitamente de retirar. Não creio mais que William Shakespeare, o ator de Stratford, tenha sido o autor das obras que há tanto tempo tem sido atribuídas a ele. Desde da publicação do volume de J. Thomas Looney, Shakespeare Indentified, 1920, estou convencido dede que de fato Edward de Vere, Conde de Oxford, se acha oculto por trás desse pseudônimo”[11].
A tese provocou certo mal-estar aos seus seguidores de Freud, seu tradutor em língua inglesa, o supra-citado James Strachey, para ele em língua inglesa a menção de Looney, poderia causa uma impressão jocosa num leitor médio inglês, já que “looney” em inglês significa doido.
Na edição brasileira há um apontamento da querela entre o Freud e seu tradutor, numa carta de 29 de agosto de 1935, nosso autor diz a seu tradutor:
“No tocante a nota de Shakespeare-Oxford, sua proposta me coloca na posição inusitada de mostrar-me um oportunista. Não posso compreender a atitude inglesa quanto a essa questão. Edward de Vere por certo foi um inglês tão autentico quanto Will Shakespeare. Mas visto que o assunto se acha tão afastado do interesse analítico, e visto que você da importância a que eu me mostre reticente, estou pronto a eliminar a nota, ou apenas inserir uma frase como ‘Por motivos particulares não desejo mais dar ênfase a esse ponto’. Você mesmo resolva isso. Por outro lado, gostaria que a nota fosse mantida na integra na edição norte-americana. A mesma espécie de defesa narcisica não precisa ser temida ali”.
Na edição inglesa, ficou a nota sugerida posteriormente, da não insistência sobre esse ponto, mas nas demais, na americana, a insistência, a ênfase ficou na manutenção da menção original de Freud e, não na sugerida e transformada por seu tradutor para a Inglaterra.
Nessa demanda entre Freud e seu tradutor, se ficou sobre um jogo de aparências, a questão profunda era o nome e prejuízos irônicos dele, não era a questão saber se a tese estava correta ou não. Assim, como se restou na aparência, no politicamente correto, a posição freudiana, a não manifestação na Inglaterra, e sua ênfase nos demais locais, um outro jogo de aparências.
Quando a discussão rumava para campos de profundidade, os ouvidos de Freud negavam-se a admitir conclusões em sentido oposto, a coisa se explica por ela mesma.
Assim, Jones indagado por Freud para reunir elementos extras de convencimentos, mas Jones que confessava achar a tese oxfordiana pouco provável, disse que procurando auxilio de um literato inglês sobre o assunto a resposta que encontrou foi que ele possuía “uma opinião depreciativa do livro, tomando como base, principalmente, os indícios sobre a identidade de S. que são conhecidos hoje em dia, na verdade, bastante consideráveis”, mas isto ao invés de trazer de diminuir o fanatismo de Freud pelo homem de Oxford, trouxe ao cego mais fúria e razão de crença na existência de um Conde de Oxford, que escrevia sobre o pseudônimo de Shakespeare.
Em junho de 1938, três anos depois da nota, Freud permanece fixo em sua opinião, apesar das ironias do seu tradutor ou da descrença de Jones, sobre Looney, considera-o como “autor de um livro extraordinário”, e confessa ser seu seguidor[12].
Complexo de Jones.
“O evento que ele representa não se realizará, mas se fosse possível, seus efeitos provavelmente seriam tais como ele os determinou e pode-se dizer que não apenas mostrou a natureza humana como ela se comporta na realidade, em situações difíceis, mas também em aflições as quais não pode ser exposta”[13].
Samuel Johnson
Apesar das desconfianças, Ernest Jones acredita também que Hamlet não pode ter outra explicação a não ser aquela levantada por Freud em base.
De que somente um homem com uma experiência trágica em relação ao pai poderia escrever tal peça.
A morte, a perca do pai, a satisfação dessa morte se torna o viés interpretativo em Jones, Hamlet não é uma perssona, por soa a voz do autor, as dores do autor, assim para justificar essa busca para alem do posto, ele vai as experiências iniciais do autor, busca nele sua fonte para explicações.
“Um psicanalista pode muitas vezes ir ainda mais alem e esclarecer algo sobre os primórdios do desenvolvimento mental do homem, dado que as experiências iniciais deixam uma impressão bem mais funda do que as recentes”[14].
Assim, para pular para uma desconstituição de Hamlet para buscar no autor as razoes da fascinação teatral é simples, assim nos esmiúça Jones o modo como isso se realiza:
“Proponho-me a fazer de conta que Hamlet foi uma pessoa, um ser vivo (poderíamos acrescentar que para a maioria de nos, ele he uma criatura mais viva que muitos atores que conhecemos pelos palcos da vida!), e investigar que espécie de homem pode ter sido essa pessoa para sentir e agir, em certas situações, da maneira que Shakespeare nos diz que ele sentiu e agiu”[15].
Então, a estratégia a que Taine disse antes, pegar na multiplicidade das personagens de Shakespeare, o Shakespeare, o autor no meio das suas criaturas. Ou como o próprio Taine diz que “Hamlet é Shakespeare, e no remate de uma galeria de retratos, onde todos têm alguns traços dele próprio, Shakespeare retratou-se na mais impressionante de suas criações”[16].
“Shakespeare é incompreendido quando Hamlet é tomado como um produto moderno – espírito intoxicado de mórbidas cogitações, sem capacidade para ação. E uma verdadeira aberração do destino errôneo que ele tenha-se convertido[17].”
Partindo nessa busca do real Shakespeare na obra, ao mesmo tempo em que não se pode tomar ele como um produto de meio, um ser influenciado por teses psicanalíticas, ou por, como Bloom diz sempre com sua ironia, por escolas de ressentimento, a posição de Jones é paradoxal, ao mesmo tempo quer encaixar o autor de Hamlet em esquemas psicanalíticos, mas não quer deixar a esse a consciência desses moveres inconscientes.
“Por que o poeta não elucidou mais claramente a tendência mental que estamos tentando descobrir? Por estranho que pareça, a resposta é a mesma que para o próprio Hamlet, quer dizer, Shakespeare não pode explica-la tampouco tinha consciência de sua natureza”[18].
Seguindo nessa inconsciência que ele vê em Shakespeare, surge o tema da morte do pai, à vontade de morte frente à disputa pai-filho pela mãe, ele retoma um termo que vimos antes, o desejo fratricida oculto em Shakespeare, o conflito que Hamlet representa, que idealiza a ponte entre a obra inglesa e a clássica de Sófocles.
Para confirmar essa presença forte do desejo de morte presente em Hamlet, que serve de ponte de ligação com o Complexo de Édipo, Jones cita outro dramaturgo, Bernard Shaw, um achado para reforçar a essa ponte ligada ao desejo de livrar-se dos outros através da morte do pai.
“Podereis certamente recordar que, na terra embora, é claro, nunca o confessassemos – a morte de alguém que conhecíamos, mesmo daquelas pessoas a quem mais queríamos, misturava-se sempre certa satisfação por estarmos, finalmente livres delas”[19]
Mas, o conflito já foi dado as razão mestra do mote conflitual, agora Jones, a partir daí, começa a fragmentação do conflito Hamlet com seu padatro, com a morte do pai e seu desejo edipiano pela mãe.
A repressão do desejo eh o primeiro tema, começa a ser a estudado por Jones, primeiro ele começa a falar da repressão.
“Se a paixão despertada sofre uma ‘repressão’ insuficiente, então o rapaz poderá continuar a vida toda anormalmente ligado a sua mãe e incapaz de amar qualquer outra mulher, uma causa nada invulgar de celibato”[20]
A causa dessa repressão eh a divisão da imagem materna em duas, uma erótica, que Lacan identifica em outra personagem, a Ofélia e outra, a mãe virginal.
“com a divisão (splitting) da imagem materna que é efetuada pelo inconsciente infantil, cindido-a em duas imagens opostas: uma, a da Madona virginal, a santa inacessível em relação a qual todos os contatos sensuais são impensáveis; e a outra, a da criatura sensual acessível a todos”[21].
Interessante notar as diferentes interpretações em Jones, há sempre uma divisão dos personagens, já em Lacan, há personagens que se unificam. Mas nos dois a duplicidade, o velado e o inconsciente sempre fazem o jogo, o autor e o personagem, pai e filho, Shakespeare e Duque de Oxford, a polaridade, a complexidade sempre se apresenta.
E o problema do personagem, a paralisia que ninguém consegue explicar, mas que se encontra presente em todos, o inconsciente, Jones tenta explicar aquilo que Freud deixou em aberto afinal.
“A ação é paralisada logo no principio e assim se produz o quadro de uma inibição aparentemente fortuita e por isso inexplicável para Hamlet como para os leitores da peça. Contudo, essa paralisia resulta não da covardia física ou moral, mas daquela covardia intelectual, daquela relutância em atrevou-se a sondar seu intimo, que Hamlet compartilha com o resto da humanidade: Assim, a consciência faz covarde de todos nos.”[22]
Mas nem tudo Jones assume de Freud, a tese looneyana, da morte que servira para a escritura de Hamlet, sobre a tese do inglês e da dissolução do homem de Stratford, conclui Jones que:
“Contudo, as datas e circunstancias são demasiado imprecisas para nos permitirem encarar a suposição de Freud como algo mais do que um palpite ou uma intuição.”[23]
Complexo de Lacan.
“Shakespeare abre uma rima que contem ouro e diamantes em uma abundancia inesgotável, embora empenados por crostas, aviltados por impurezas e misturados com um amontoado de minerais inferiores”.[24]
Samuel Johnson
Lacan em seu Hamlet, parte logo colocando Hamlet como duplo de Claudius, e essa chave interpretativa leva as conseqüências edipianas concretas.
A morte não é uma hipótese a ser concretizada como em Jones, a paralisia aqui é do desejo, e não da vontade de eliminar o oposto. Porque em Lacan, a morte já aconteceu:
“Aqui o pai sabe muito bem que esta morto, morto de acordo com o voto daquele que queria tomar seu lugar, ou seja, Claudius, seu irmão. Mas o crime em si esta escondido para o mundo da cena”[25].
“Dar-se-á então que Claudius é uma forma de Hamlet, e que ele realiza, é o desejo de Hamlet”.[26]
A morte, em Lacan, coloca Hamlet para outro conflito. Um com seu duplo, Claudius, mas ambos aqui são um, então, não tem sentido como em Jones perguntar-se porque não ocorre a morte de Claudius, pois se morre este morre o que há de fundamental e negado no primeiro.
Nisso, ele se diferencia colocando a universalidade de Shakespeare, não como mestre das luzes, mas das sombras, a imobilidade de Hamlet não se encontra na dimensão faustica da conhecimento.
Nisso, se desloca do iluminismo romântico de Goethe, coloca Hamlet como Freud e Jones, como paradigma do oculto, do reflexo da sombra, do inconsciente.
“Para Goethe, Hamlet e a ação paralisada pelo pensamento...Hamlet eh o homem que vê todos os elementos, as complexidades do jogo da vida, e este conhecimento paralisa sua vida”[27]
Ao contrario de Goethe, que vê a paralisia na visão aberta das escolhas que para ele não estão ocultas, mas desveladas demasiadamente. Para Lacan, as imagens se ocultam em arapucas e armadilhas universais. Nesse sentido conclui ele.
“A peça Hamlet eh uma espécie dee aparelho, de rede, de arapuca, onde esta articulado o desejo do homem, e precisamente nas coordenadas que Freud nos desvenda, ou seja, o Édipo e a castração”[28].
Ele seguindo o caminho freudiano, coloca mesmo na vida real o motivos da peça, a morte já ocorreu, ate mesmo, na vida real do próprio Shakespeare. Assim, caminhando mais próximo de Freud.
Lacan, não se posta como seguidor de Looney, mas de Freud, concorda com a morte do pai de Shakespeare, ou do, Duque de Oxford como elemento decisivo para interpretação de Hamlet.
“O aprofundamento do oficio do autor não basta para explicar esta virada. Portanto, algo se passou na vida de Shakespeare durante a concepção de Hamlet. O que podemos dizer a respeito? – senão que trata da morte de seu pai”[29].
Complexo de Hamlet.
“A vida é sombra errante, um pobre ator
Que orna e atropela a sua fala em cena
E some para sempre: é uma fabula
Contada por um tolo, em som e fúria,
E significando nada.”“.
Shakespeare in Macbeth.
O verdadeiro Hamlet foi Shakespeare? Nossa reposta não pode ser concluída assim, sem antes colocarmos um nome real ao verdadeiro Shakespeare.
Em Cânone Universal de Harold Bloom, descobrimos a resposta negativa a essa aporia que tanto causou desconforto aos discípulos e amigos de Freud e conforto para a mente freudiana.
Bloom nos diz num tom bastante ressentido que:
”Nada, é claro, podia ser mais maluco: Edward de Vere, décimo sétimo Duque de Oxford, nasceu em 1550 e morreu em 1604. Portanto, estava morto antes da composição de Rei Lear, Macbeth, Antonio e Cleópatra, e das historias romanescas shakespearianas posteriores. Para ser looneista, é preciso começar argumentando que essas pecas foram deixadas em manuscrito quando Oxford morreu, e partir daí. Como pode Freud, possivelmente a melhor mente do nosso século. Cair numa maluquice dessas?”[30]
Bloom relembra como Freud desmontou seus três maiores personagens em influencia segundo Jones: Moises, Leonardo e Shakespeare.
A genialidade de Leonardo é trocada por uma analise de elementos infantis recalcados, Moises, o libertador dos judeus, é posto como um egípcio que assassinado pelos judeus, se tornara um ídolo totêmico judaico.
Já Shakespeare, “foi apagado, para ser substituído por um titânico aristocrata menos poderoso do que fora o poeta-dramaturgo[31]”.
O critico literário coloca Freud como um codificador em prosa das intuições que Shakespeare colocara em verso anos antes. Para ele, Shakespeare na verdade, é o inventor da psicanálise, isso pode ser lido na mesma pagina.
Ai, Bloom começa a identificação de Freud não como o homem que pensa as sombras como Hamlet, mas o que se aproveita delas para realizar seus planos, o traidor Macbeth.
Bloom, chega a dizer que Freud mascara sua divida colocando Sófocles como orientador de seu complexo, sendo que para ele, na verdade não a teoria do complexo de Édipo, se liga mais a obra shakespeariana que a do autor grego. Continuando sua argumentação da centralidade shakespeariana, Bloom nos diz que o que todos temos eh Complexo de Hamlet, e não o de Édipo.
Conclui seu estudo sobre as relações entre Freud e Shakespeare que:
“Shakespeare é a apoteose da liberdade e originalidade artísticas. Freud tinha ansiedade em relação a ele porque aprendera ansiedade com ele, como ele aprendera ambivalência, narcisismo e cisma no eu. [32]”
Em sua elegia para Shakespeare, conclui Bloom, com uma sentença de Ermerson.
“Hoje, a literatura, a filosofia e o pensamento estão shakespearizados. A mente dele é o horizonte alem do qual, atualmente, não vemos”[33].
Dentro desse horizonte, a obra Hamlet se coloca mais como fruto da genialidade do homem de Stratford do que hipóteses de relatos de corte ou frutos de experiências fúnebres com o pai.
Para concluir, termino conforme foi o viés de todo esse trabalho, citações e bases textuais. Concluo com Otto Maria Carpeaux, em seu ensaio “A verdade sobre Édipo”:
“O mal da interpretação psicanalítica do mito e da tragédia so reside na possibilidade de qualquer um agora poder intepretar igualmente assim os monstros de sua própria imaginação. Sobretudo nas mãos sacrílegas de biógrafos, o complexos já serviu para explicar tudo”[34].
Enfim, o trabalho tem como propósito revelar que diante do gênio humano, não basta essa chave de leitura.
BIBLIOGRAFIA
BLOOM, Harold O Cânone Ocidental: Os Livros e a Escola do Tempo trad. Marcos Santarrita Objetiva: São Paulo,s/d
CARPEAUX, Otto Maria Ensaios Reunidos vol.1 Rio de Janeiro: Topbooks,2001.
FREUD, Sigmund ENSAIO AUTO-BIOGRAFICO
______, _______ PERSONAGENS PSICOPATICOS NO PALCO Edição Standard Brasileira Vol. VII (1901-1905) Rio de Janeiro: Imago,s/d.
GAY, Peter LENDO FREUD: INVESTIGAÇOES E ENTRETENIMENTOS Rio de Janeiro: IMAGO, 1992.
GIRARD, Rene A VIOLENCIA E O SAGRADO São Paulo: Ed. Unesp/Paz e Terra,s/d
JOHNSON, Samuel PREFACIO A SHAKESPEARE seguido de RANCINE E SHAKESPEARE de Stendhal trad. Enid Abreu Dobranszky Sao Paulo: Iluminuras,1996.
JONES, Ernest HAMLET E O COMPLEXO DE EDIPO
LACAN, Jacques HAMLET por Lacan trad. Claudia Berlinei Campinas: Escuta/Libliu, 1986.
MONZANI, L. Roberto FREUD: movimento do pensamento Campinas: Edunicamp,s/d.
NOTAS
[1] Nossas especulações troçam de nos, envergonhando-nos, quando posteriormente nos deparamos com outras melhores
[2] FREUD, S. in Personagens Psicopaticos no Palco.
[3] FREUD, Sigmund Personagens Psicopaticos no Palco p . 295.
[4] Ibid idem, p. 296.
[5] JOHNSON,Samuel p.39
[6] Ibid. Idem, p.89.
[7] GAY, Peter, p. 28.
[8] FREUD, S. Carta a Lytton Strachey, 25 de Dezembro de 1928 in GAY, p.30.
[9] BLOOM, Harold., p.360.
[10] GAY, Peter, p.31,32.
[11] FREUD, S. Um Estudo Autobiográfico, p. 66.
[12] GAY, Peter, p.37
[13] JOHSON,Samuel, p.39.
[14] JONES, Ernest p. 20
[15] Ibid, idem, p. 21.
[16] Ibid. idem, p. 23.
[17] Ibid.Idem, p. 38.
[18] Ibid. Idem, p. 51.
[19]Bernard Shaw in Ibid. Idem, p. 73
[20] Ibid. Idem, p. 78.
[21] Ibid. Idem, p.86
[22] Ibid. Idem, p.91.
[23] Ibid. Idem, p.113.
[24] JOHNSON, S., p. 57
[25] LACAN, Jacques, p. 7.
[26] Ibid. Idem, p. 8.
[27] Ibid. Idem, p. 15
[28] ibid. Idem , p. 18.
[29] Ibid. Idem, p.30.
[30] BLOOM, H., p.359.
[31] Ibid. Idem, p.361.
[32] Ibid. idem ., p.378.
[33] Ibid idem. p. 378
[34] CARPEAUX, O.M., p.643.
Um ponto de complexos
“Illudunt nobis conjucturae nostrae, quarum nos pudet, posteaquam in meliores codices incidimus”[1].
Scaligei a Salmasius, Espitolae 1627, espitola CCXLVII
O Complexo de Freud.
“Em Hamlet, de fato, o conflito está tão oculto que coube a mim desvenda-lo”[2].
Freud
O texto em que Freud faz essa profecia a respeito de si mesmo é de 1905/1906, depois de ter erigido Édipo como chave dos mistérios e a si mesmo como chaveiro com a Interpretação dos Sonhos.
O decifrador da Esfinge busca as soluções para outra esfinge, o fantasma de Hamlet, para se descobrir à solução desse enigma fantasmagórico, ele quer pesquisar outro fantasma, o fantasma do próprio Shakespeare.
O meio para a solução do espírito de Shakespeare e de Hamlet, de tamanho mistério seria a obra de Freud: o Édipo.
Ele surge como chave decifradora de todos os enigmas do intelecto e da vida humana. E nessa questão, eis o seu símbolo de maior expressão no teatro, o personagem mais enigmático de todos, Hamlet.
O diagnostico freudiano colocou Hamlet como neurótico, ou um melhor:
... um homem ate então normal torna-se neurótico devido a natureza particular da tarefa com se defronta, ou seja, um homem em quem uma moção ate ali recalcada com êxito esforça-se por se impor[3].
Continua Freud sua prescrição da solução da psique hamletiana distinguindo nela três características principais:
(1) O herói não e um psicopata, transformando-se em tal apenas no decorrer da ação. (2) A moção recalcada figura entre as que são igualmente recalcadas em todos nos; seu recalcamento faz parte das bases de nosso desenvolvimento pessoal, e justamente ele quem a situação da peça vem contestar. Essas duas características facilitam que nos reconheçamos no herói; somos susceptíveis ao mesmo conflito que ele, pois ‘quem não perde a razão nessas circunstancias não tem razão nenhuma a perder. (3) Mas parece precondição desse modelo artístico que a moção que luta por chegar a consciência, por mais notória que se revele, não seja chamada por seu próprio nome; assim, o processo consuma-se de novo no espectador, com sua atenção distraída, e ele se torna presa de sentimentos, em vez de se aperceber do que esta acontecendo. Poupa-se desse modo, sem duvida, uma certa dose de resistência, tal como a que encontramos no trabalho analítico, onde os retornos do recalcado, por provocarem uma resistência menor, chegam a consciência, ao passo que o próprio recalcado não consegue faze-lo[4].
Nesse sentido, tempos atrás viu Samuel Johnson para ele no palco de Shakespeare “as imitações causam dor ou prazer; não porque nos recordam a realidade. Quando a imaginação se delicia com uma paisagem pintada, não julgamos que as arvores nos dêem sombra, ou as fontes do refrigério, mas pensamos como seria agradável estar diante dessas fontes borbulhantes e bosques oscilantes como esses”[5]·.
O transporte espaço-temporal, no fundo se trata de um transporte psíquico, num ato de sedução, num sub ducere, num conduzir por baixo da consciência, que Shakespeare impõe a seus espectadores atentos.Stendhal, diz que no teatro “o fato e que o espectador, atraído pela ação, não se surpreende com nada; ele absolutamente não se da conta do tempo percorrido[6]”.
Mas para onde se levam os espectadores? Para onde caminha a dramaturgia shakespeariana, que sua obra labora no ser dos seus seduzidos. Samuel Johnson insiste que “o evento que ele representa não se realizara”.
Em seu “Ensaio Autobiográfico”, Freud continua a saga profilática da mente de Hamlet-Shakespeare.
Para essa profilaxia da mente de Hamlet e explicar as razoes do seu imobilismo factual Freud estende para alem de Hamlet a três características para toda obra literária, surge Hamlet como paradigma da criação artística, onde o autor conduziria o espectador na progressão do recalcamento.
Hamlet possui um conflito interno que ficou desde sua primeira aparição publica negada sua resolução a platéia, a chave do mistério, que desvendaria o porque de tanto imobilismo frente a Claudius e a mãe adultera ficou negado ao publico, que só tem acesso a ele, num recalcamento em si mesmo, e nunca consegue conjugar representativamente tais motivos tão ocultos.
Freud vem trazer luzes para esse enigma, colocando sua descoberta do mecanismo da psique humana, o Complexo de Édipo na vida mesma de Shakespeare, ou melhor, do Duque de Oxford.
A luz é tomada emprestada de J.T. Looney, que em sua obra de 1920, “Shakespeare Identified”, identifica Shakespeare como sendo um tal duque ou conde de Oxford, de nome Edward de Vere, um sujeito que havia perdido o pai um ano antes da escritura de Hamlet.
O que Shakespeare, na aurora do outono de 1897, havia dado luzes numa carta a Fliess, quando “ele menciona por alto a sua descoberta, mas num tom confiante: ‘Me ocorreu de passagem’, escreveu, que o conflito edipiano retratado por Sófocles em Édipo Rei poderia ‘ também estar no fundo de Hamlet. Não estou pensando na intenção consciente de Shakespeare’, acrescentou, ‘mas acredito, sim, que um acontecimento real estimulou o poeta a fazer uma descrição, dizendo mesmo, uma vez que o seu inconsciente compreendia perfeitamente o inconsciente do herói. Como histérico Hamlet justifica a frase: “Assim, a consciência torna covardes a nos todos?” Como ele explica a sua hesitação em vingar a morte do pai, assassinando o tio – Hamlet, o mesmo sem hesitar envia os seus cortesãos para a morte, e que é indubitavelmente precipitado ao assassinar Laertes?’ Hamlet, concluiu, devia estar atormentado pela memória obscura de ter alimentado desejos homicidas contra o próprio pai”[7].
Na mesma pagina Peter Gay expõe o erro da afirmação freudiana, quanto à pretensa não-hesitação hamletiana diante de outros objetos não-relacionados à figura do pai ou materna, Hamlet, mata a Polônio, pai de Laertes, Peter Gay termina sua nota numa reconciliação a temática edipiana, falando que Freud tão emaranaranhado num véu edipiano, não conseguiu enxergar ou encarar a enormidade da hostilidade edipiana que o filho dirige contra o pai.
James T. Looney, o autor que deu a identidade que Freud precisara, veio tarde para Freud, pois a busca por um Shakespeare com motivos inconscientes, um outro alem do ator de Stratford começara muito antes.
A primeira concepção em alta nos círculos freqüentados da época era que Shakespeare era Francis Bacon, dela acordava Meynert, Freud contra essa hipótese argumentou que:
“se fosse assim, Bacon teria sido o cérebro mais poderoso que o mundo já produziu, enquanto que na minha opinião , eh preciso dividir as realizações de Shakespeare entre diversos rivais, ao invés de sobrecarregar um outro homem importante com elas.[8]”
Há mais uma hipótese, convencido através de retratos do homem enigma, sem identidade agora, Freud assegura-se dos traços latinos de Shakespeare e chega a adotar tese que ele seria um tal de Jacques Pierre.
Sobre tal, ironiza Harold Bloom nos dizendo que:
“Rejeitando a tese baconiana, Freud pegou todas as outras idéias esquisitas postas em circulação sobre e contra Shakespeare, incluindo a sugestão de um acadêmico italiano de que o nome era a versão de Jacques Pierre!”[9]
Por fim, nos idos de 1926 Freud identifica a verdadeira perssona de Shakespeare, em Shakespeare Identified de J. Thomas Looney, no começo ele assumia timidamente a idéia que Edward de Vere fosse Shakespeare. No discurso de recebimento do Premio Goethe ele nos diz que:
“É inegavelmente embaraçoso para nos todos não saber ainda quem e o autor das comedias, das tragédias e dos sonetos de Shakespeare, se ele foi realmente o filho ignorante de um pequeno burguês de Stratford, que obteve uma modesta posição de ator em Londres, ou se ele foi o aristocrata levemente declasse e ardentemente dissoluto, de origem nobre e educação requintada, Edward de Vere, décimo sétimo conde de Oxford, e Lord Great Chamberlain, hereditário da Inglaterra.”[10]
Aqui, parece aquele recurso teórico da falsa pergunta, a pergunta que já contem em si a resposta, ou como Freud gosta, a coisa que explica a si mesma, a resposta que já estava embutida.
Num outro lance de pensamento anterior ao discurso na casa Goethe, sua posição já era mais explicita em favor da hipótese looneyana, numa nota a Interpretação dos Sonhos de 1928, ele diz que perdera a fé na suposição que homem de Stratford fosse realmente Shakespeare.
Já havia em Freud uma tendência a negar a realidade de Shakespeare, como filho de um fabricante de luvas,em 1935 veio a consagração da presença de Looney na mente de Freud. Para afirmar que não fora Shakespeare havia escrito Hamlet logo após a morte do pai, Freud fortalece em uma nota de rodapé a hipótese do Duque de Oxford.
O texto base da nota de rodapé é a seguinte afirmação escrita em 1925,1926, esta no “Um Estudo Autobiográfico.
“Hamlet, objeto de admiração por trezentos anos, sem que seu significado tivesse sido descoberto ou os motivos de seu autor adivinhamos. Mal poderia haver a possibilidade de que essa criação neurótica do poeta viesse a malograr, como seus inúmeros companheiros da vida real, sobre o complexo de Édipo; e diante daquela tarefa seu braço ficou paralisado pelo próprio obscuro sentimento de culpa. Shakespeare escreveu Hamlet logo após a morte de seu pai”.
Sobre essa ultima sentença dessa cadeia argumentativa que nasce a conturbada nota a seguir transposta.
“Esta é uma interpretação que gostaria explicitamente de retirar. Não creio mais que William Shakespeare, o ator de Stratford, tenha sido o autor das obras que há tanto tempo tem sido atribuídas a ele. Desde da publicação do volume de J. Thomas Looney, Shakespeare Indentified, 1920, estou convencido dede que de fato Edward de Vere, Conde de Oxford, se acha oculto por trás desse pseudônimo”[11].
A tese provocou certo mal-estar aos seus seguidores de Freud, seu tradutor em língua inglesa, o supra-citado James Strachey, para ele em língua inglesa a menção de Looney, poderia causa uma impressão jocosa num leitor médio inglês, já que “looney” em inglês significa doido.
Na edição brasileira há um apontamento da querela entre o Freud e seu tradutor, numa carta de 29 de agosto de 1935, nosso autor diz a seu tradutor:
“No tocante a nota de Shakespeare-Oxford, sua proposta me coloca na posição inusitada de mostrar-me um oportunista. Não posso compreender a atitude inglesa quanto a essa questão. Edward de Vere por certo foi um inglês tão autentico quanto Will Shakespeare. Mas visto que o assunto se acha tão afastado do interesse analítico, e visto que você da importância a que eu me mostre reticente, estou pronto a eliminar a nota, ou apenas inserir uma frase como ‘Por motivos particulares não desejo mais dar ênfase a esse ponto’. Você mesmo resolva isso. Por outro lado, gostaria que a nota fosse mantida na integra na edição norte-americana. A mesma espécie de defesa narcisica não precisa ser temida ali”.
Na edição inglesa, ficou a nota sugerida posteriormente, da não insistência sobre esse ponto, mas nas demais, na americana, a insistência, a ênfase ficou na manutenção da menção original de Freud e, não na sugerida e transformada por seu tradutor para a Inglaterra.
Nessa demanda entre Freud e seu tradutor, se ficou sobre um jogo de aparências, a questão profunda era o nome e prejuízos irônicos dele, não era a questão saber se a tese estava correta ou não. Assim, como se restou na aparência, no politicamente correto, a posição freudiana, a não manifestação na Inglaterra, e sua ênfase nos demais locais, um outro jogo de aparências.
Quando a discussão rumava para campos de profundidade, os ouvidos de Freud negavam-se a admitir conclusões em sentido oposto, a coisa se explica por ela mesma.
Assim, Jones indagado por Freud para reunir elementos extras de convencimentos, mas Jones que confessava achar a tese oxfordiana pouco provável, disse que procurando auxilio de um literato inglês sobre o assunto a resposta que encontrou foi que ele possuía “uma opinião depreciativa do livro, tomando como base, principalmente, os indícios sobre a identidade de S. que são conhecidos hoje em dia, na verdade, bastante consideráveis”, mas isto ao invés de trazer de diminuir o fanatismo de Freud pelo homem de Oxford, trouxe ao cego mais fúria e razão de crença na existência de um Conde de Oxford, que escrevia sobre o pseudônimo de Shakespeare.
Em junho de 1938, três anos depois da nota, Freud permanece fixo em sua opinião, apesar das ironias do seu tradutor ou da descrença de Jones, sobre Looney, considera-o como “autor de um livro extraordinário”, e confessa ser seu seguidor[12].
Complexo de Jones.
“O evento que ele representa não se realizará, mas se fosse possível, seus efeitos provavelmente seriam tais como ele os determinou e pode-se dizer que não apenas mostrou a natureza humana como ela se comporta na realidade, em situações difíceis, mas também em aflições as quais não pode ser exposta”[13].
Samuel Johnson
Apesar das desconfianças, Ernest Jones acredita também que Hamlet não pode ter outra explicação a não ser aquela levantada por Freud em base.
De que somente um homem com uma experiência trágica em relação ao pai poderia escrever tal peça.
A morte, a perca do pai, a satisfação dessa morte se torna o viés interpretativo em Jones, Hamlet não é uma perssona, por soa a voz do autor, as dores do autor, assim para justificar essa busca para alem do posto, ele vai as experiências iniciais do autor, busca nele sua fonte para explicações.
“Um psicanalista pode muitas vezes ir ainda mais alem e esclarecer algo sobre os primórdios do desenvolvimento mental do homem, dado que as experiências iniciais deixam uma impressão bem mais funda do que as recentes”[14].
Assim, para pular para uma desconstituição de Hamlet para buscar no autor as razoes da fascinação teatral é simples, assim nos esmiúça Jones o modo como isso se realiza:
“Proponho-me a fazer de conta que Hamlet foi uma pessoa, um ser vivo (poderíamos acrescentar que para a maioria de nos, ele he uma criatura mais viva que muitos atores que conhecemos pelos palcos da vida!), e investigar que espécie de homem pode ter sido essa pessoa para sentir e agir, em certas situações, da maneira que Shakespeare nos diz que ele sentiu e agiu”[15].
Então, a estratégia a que Taine disse antes, pegar na multiplicidade das personagens de Shakespeare, o Shakespeare, o autor no meio das suas criaturas. Ou como o próprio Taine diz que “Hamlet é Shakespeare, e no remate de uma galeria de retratos, onde todos têm alguns traços dele próprio, Shakespeare retratou-se na mais impressionante de suas criações”[16].
“Shakespeare é incompreendido quando Hamlet é tomado como um produto moderno – espírito intoxicado de mórbidas cogitações, sem capacidade para ação. E uma verdadeira aberração do destino errôneo que ele tenha-se convertido[17].”
Partindo nessa busca do real Shakespeare na obra, ao mesmo tempo em que não se pode tomar ele como um produto de meio, um ser influenciado por teses psicanalíticas, ou por, como Bloom diz sempre com sua ironia, por escolas de ressentimento, a posição de Jones é paradoxal, ao mesmo tempo quer encaixar o autor de Hamlet em esquemas psicanalíticos, mas não quer deixar a esse a consciência desses moveres inconscientes.
“Por que o poeta não elucidou mais claramente a tendência mental que estamos tentando descobrir? Por estranho que pareça, a resposta é a mesma que para o próprio Hamlet, quer dizer, Shakespeare não pode explica-la tampouco tinha consciência de sua natureza”[18].
Seguindo nessa inconsciência que ele vê em Shakespeare, surge o tema da morte do pai, à vontade de morte frente à disputa pai-filho pela mãe, ele retoma um termo que vimos antes, o desejo fratricida oculto em Shakespeare, o conflito que Hamlet representa, que idealiza a ponte entre a obra inglesa e a clássica de Sófocles.
Para confirmar essa presença forte do desejo de morte presente em Hamlet, que serve de ponte de ligação com o Complexo de Édipo, Jones cita outro dramaturgo, Bernard Shaw, um achado para reforçar a essa ponte ligada ao desejo de livrar-se dos outros através da morte do pai.
“Podereis certamente recordar que, na terra embora, é claro, nunca o confessassemos – a morte de alguém que conhecíamos, mesmo daquelas pessoas a quem mais queríamos, misturava-se sempre certa satisfação por estarmos, finalmente livres delas”[19]
Mas, o conflito já foi dado as razão mestra do mote conflitual, agora Jones, a partir daí, começa a fragmentação do conflito Hamlet com seu padatro, com a morte do pai e seu desejo edipiano pela mãe.
A repressão do desejo eh o primeiro tema, começa a ser a estudado por Jones, primeiro ele começa a falar da repressão.
“Se a paixão despertada sofre uma ‘repressão’ insuficiente, então o rapaz poderá continuar a vida toda anormalmente ligado a sua mãe e incapaz de amar qualquer outra mulher, uma causa nada invulgar de celibato”[20]
A causa dessa repressão eh a divisão da imagem materna em duas, uma erótica, que Lacan identifica em outra personagem, a Ofélia e outra, a mãe virginal.
“com a divisão (splitting) da imagem materna que é efetuada pelo inconsciente infantil, cindido-a em duas imagens opostas: uma, a da Madona virginal, a santa inacessível em relação a qual todos os contatos sensuais são impensáveis; e a outra, a da criatura sensual acessível a todos”[21].
Interessante notar as diferentes interpretações em Jones, há sempre uma divisão dos personagens, já em Lacan, há personagens que se unificam. Mas nos dois a duplicidade, o velado e o inconsciente sempre fazem o jogo, o autor e o personagem, pai e filho, Shakespeare e Duque de Oxford, a polaridade, a complexidade sempre se apresenta.
E o problema do personagem, a paralisia que ninguém consegue explicar, mas que se encontra presente em todos, o inconsciente, Jones tenta explicar aquilo que Freud deixou em aberto afinal.
“A ação é paralisada logo no principio e assim se produz o quadro de uma inibição aparentemente fortuita e por isso inexplicável para Hamlet como para os leitores da peça. Contudo, essa paralisia resulta não da covardia física ou moral, mas daquela covardia intelectual, daquela relutância em atrevou-se a sondar seu intimo, que Hamlet compartilha com o resto da humanidade: Assim, a consciência faz covarde de todos nos.”[22]
Mas nem tudo Jones assume de Freud, a tese looneyana, da morte que servira para a escritura de Hamlet, sobre a tese do inglês e da dissolução do homem de Stratford, conclui Jones que:
“Contudo, as datas e circunstancias são demasiado imprecisas para nos permitirem encarar a suposição de Freud como algo mais do que um palpite ou uma intuição.”[23]
Complexo de Lacan.
“Shakespeare abre uma rima que contem ouro e diamantes em uma abundancia inesgotável, embora empenados por crostas, aviltados por impurezas e misturados com um amontoado de minerais inferiores”.[24]
Samuel Johnson
Lacan em seu Hamlet, parte logo colocando Hamlet como duplo de Claudius, e essa chave interpretativa leva as conseqüências edipianas concretas.
A morte não é uma hipótese a ser concretizada como em Jones, a paralisia aqui é do desejo, e não da vontade de eliminar o oposto. Porque em Lacan, a morte já aconteceu:
“Aqui o pai sabe muito bem que esta morto, morto de acordo com o voto daquele que queria tomar seu lugar, ou seja, Claudius, seu irmão. Mas o crime em si esta escondido para o mundo da cena”[25].
“Dar-se-á então que Claudius é uma forma de Hamlet, e que ele realiza, é o desejo de Hamlet”.[26]
A morte, em Lacan, coloca Hamlet para outro conflito. Um com seu duplo, Claudius, mas ambos aqui são um, então, não tem sentido como em Jones perguntar-se porque não ocorre a morte de Claudius, pois se morre este morre o que há de fundamental e negado no primeiro.
Nisso, ele se diferencia colocando a universalidade de Shakespeare, não como mestre das luzes, mas das sombras, a imobilidade de Hamlet não se encontra na dimensão faustica da conhecimento.
Nisso, se desloca do iluminismo romântico de Goethe, coloca Hamlet como Freud e Jones, como paradigma do oculto, do reflexo da sombra, do inconsciente.
“Para Goethe, Hamlet e a ação paralisada pelo pensamento...Hamlet eh o homem que vê todos os elementos, as complexidades do jogo da vida, e este conhecimento paralisa sua vida”[27]
Ao contrario de Goethe, que vê a paralisia na visão aberta das escolhas que para ele não estão ocultas, mas desveladas demasiadamente. Para Lacan, as imagens se ocultam em arapucas e armadilhas universais. Nesse sentido conclui ele.
“A peça Hamlet eh uma espécie dee aparelho, de rede, de arapuca, onde esta articulado o desejo do homem, e precisamente nas coordenadas que Freud nos desvenda, ou seja, o Édipo e a castração”[28].
Ele seguindo o caminho freudiano, coloca mesmo na vida real o motivos da peça, a morte já ocorreu, ate mesmo, na vida real do próprio Shakespeare. Assim, caminhando mais próximo de Freud.
Lacan, não se posta como seguidor de Looney, mas de Freud, concorda com a morte do pai de Shakespeare, ou do, Duque de Oxford como elemento decisivo para interpretação de Hamlet.
“O aprofundamento do oficio do autor não basta para explicar esta virada. Portanto, algo se passou na vida de Shakespeare durante a concepção de Hamlet. O que podemos dizer a respeito? – senão que trata da morte de seu pai”[29].
Complexo de Hamlet.
“A vida é sombra errante, um pobre ator
Que orna e atropela a sua fala em cena
E some para sempre: é uma fabula
Contada por um tolo, em som e fúria,
E significando nada.”“.
Shakespeare in Macbeth.
O verdadeiro Hamlet foi Shakespeare? Nossa reposta não pode ser concluída assim, sem antes colocarmos um nome real ao verdadeiro Shakespeare.
Em Cânone Universal de Harold Bloom, descobrimos a resposta negativa a essa aporia que tanto causou desconforto aos discípulos e amigos de Freud e conforto para a mente freudiana.
Bloom nos diz num tom bastante ressentido que:
”Nada, é claro, podia ser mais maluco: Edward de Vere, décimo sétimo Duque de Oxford, nasceu em 1550 e morreu em 1604. Portanto, estava morto antes da composição de Rei Lear, Macbeth, Antonio e Cleópatra, e das historias romanescas shakespearianas posteriores. Para ser looneista, é preciso começar argumentando que essas pecas foram deixadas em manuscrito quando Oxford morreu, e partir daí. Como pode Freud, possivelmente a melhor mente do nosso século. Cair numa maluquice dessas?”[30]
Bloom relembra como Freud desmontou seus três maiores personagens em influencia segundo Jones: Moises, Leonardo e Shakespeare.
A genialidade de Leonardo é trocada por uma analise de elementos infantis recalcados, Moises, o libertador dos judeus, é posto como um egípcio que assassinado pelos judeus, se tornara um ídolo totêmico judaico.
Já Shakespeare, “foi apagado, para ser substituído por um titânico aristocrata menos poderoso do que fora o poeta-dramaturgo[31]”.
O critico literário coloca Freud como um codificador em prosa das intuições que Shakespeare colocara em verso anos antes. Para ele, Shakespeare na verdade, é o inventor da psicanálise, isso pode ser lido na mesma pagina.
Ai, Bloom começa a identificação de Freud não como o homem que pensa as sombras como Hamlet, mas o que se aproveita delas para realizar seus planos, o traidor Macbeth.
Bloom, chega a dizer que Freud mascara sua divida colocando Sófocles como orientador de seu complexo, sendo que para ele, na verdade não a teoria do complexo de Édipo, se liga mais a obra shakespeariana que a do autor grego. Continuando sua argumentação da centralidade shakespeariana, Bloom nos diz que o que todos temos eh Complexo de Hamlet, e não o de Édipo.
Conclui seu estudo sobre as relações entre Freud e Shakespeare que:
“Shakespeare é a apoteose da liberdade e originalidade artísticas. Freud tinha ansiedade em relação a ele porque aprendera ansiedade com ele, como ele aprendera ambivalência, narcisismo e cisma no eu. [32]”
Em sua elegia para Shakespeare, conclui Bloom, com uma sentença de Ermerson.
“Hoje, a literatura, a filosofia e o pensamento estão shakespearizados. A mente dele é o horizonte alem do qual, atualmente, não vemos”[33].
Dentro desse horizonte, a obra Hamlet se coloca mais como fruto da genialidade do homem de Stratford do que hipóteses de relatos de corte ou frutos de experiências fúnebres com o pai.
Para concluir, termino conforme foi o viés de todo esse trabalho, citações e bases textuais. Concluo com Otto Maria Carpeaux, em seu ensaio “A verdade sobre Édipo”:
“O mal da interpretação psicanalítica do mito e da tragédia so reside na possibilidade de qualquer um agora poder intepretar igualmente assim os monstros de sua própria imaginação. Sobretudo nas mãos sacrílegas de biógrafos, o complexos já serviu para explicar tudo”[34].
Enfim, o trabalho tem como propósito revelar que diante do gênio humano, não basta essa chave de leitura.
BIBLIOGRAFIA
BLOOM, Harold O Cânone Ocidental: Os Livros e a Escola do Tempo trad. Marcos Santarrita Objetiva: São Paulo,s/d
CARPEAUX, Otto Maria Ensaios Reunidos vol.1 Rio de Janeiro: Topbooks,2001.
FREUD, Sigmund ENSAIO AUTO-BIOGRAFICO
______, _______ PERSONAGENS PSICOPATICOS NO PALCO Edição Standard Brasileira Vol. VII (1901-1905) Rio de Janeiro: Imago,s/d.
GAY, Peter LENDO FREUD: INVESTIGAÇOES E ENTRETENIMENTOS Rio de Janeiro: IMAGO, 1992.
GIRARD, Rene A VIOLENCIA E O SAGRADO São Paulo: Ed. Unesp/Paz e Terra,s/d
JOHNSON, Samuel PREFACIO A SHAKESPEARE seguido de RANCINE E SHAKESPEARE de Stendhal trad. Enid Abreu Dobranszky Sao Paulo: Iluminuras,1996.
JONES, Ernest HAMLET E O COMPLEXO DE EDIPO
LACAN, Jacques HAMLET por Lacan trad. Claudia Berlinei Campinas: Escuta/Libliu, 1986.
MONZANI, L. Roberto FREUD: movimento do pensamento Campinas: Edunicamp,s/d.
NOTAS
[1] Nossas especulações troçam de nos, envergonhando-nos, quando posteriormente nos deparamos com outras melhores
[2] FREUD, S. in Personagens Psicopaticos no Palco.
[3] FREUD, Sigmund Personagens Psicopaticos no Palco p . 295.
[4] Ibid idem, p. 296.
[5] JOHNSON,Samuel p.39
[6] Ibid. Idem, p.89.
[7] GAY, Peter, p. 28.
[8] FREUD, S. Carta a Lytton Strachey, 25 de Dezembro de 1928 in GAY, p.30.
[9] BLOOM, Harold., p.360.
[10] GAY, Peter, p.31,32.
[11] FREUD, S. Um Estudo Autobiográfico, p. 66.
[12] GAY, Peter, p.37
[13] JOHSON,Samuel, p.39.
[14] JONES, Ernest p. 20
[15] Ibid, idem, p. 21.
[16] Ibid. idem, p. 23.
[17] Ibid.Idem, p. 38.
[18] Ibid. Idem, p. 51.
[19]Bernard Shaw in Ibid. Idem, p. 73
[20] Ibid. Idem, p. 78.
[21] Ibid. Idem, p.86
[22] Ibid. Idem, p.91.
[23] Ibid. Idem, p.113.
[24] JOHNSON, S., p. 57
[25] LACAN, Jacques, p. 7.
[26] Ibid. Idem, p. 8.
[27] Ibid. Idem, p. 15
[28] ibid. Idem , p. 18.
[29] Ibid. Idem, p.30.
[30] BLOOM, H., p.359.
[31] Ibid. Idem, p.361.
[32] Ibid. idem ., p.378.
[33] Ibid idem. p. 378
[34] CARPEAUX, O.M., p.643.
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