terça-feira, agosto 21, 2007

Henri Nouwen e o Perdão

Henri Nouwen, que define o perdão como "amor praticado entre pessoas que amam defeituosamente", descreve como o processo do perdão funciona:

Digo com freqüência: "Eu perdôo você". Mas, mesmo quando digo essas palavras, meu coração continua zangado ou ressentido. Ainda quero ouvir a história que me diz que eu estava certo, afinal de contas; ainda quero ouvir pedidos de desculpas e justificativas; ainda quero ter a satisfação de receber algum louvor em troca — pelo menos o louvor de ser tão perdoador!

O perdão de Deus, contudo, é incondicional; ele vem de um coração que não exige nada para si mesmo, um coração que está completamente vazio de interesses próprios. É o perdão divino que tenho de praticar em minha vida diária. Ele me convoca para continuar passando por cima de todos os meus argumentos que dizem que o perdão é loucura, doentio e impraticável. Ele me desafia a passar por cima de toda a minha necessidade de gratidão e elogios. Finalmente, ele exige de mim que eu passe por cima daquela parte ferida do meu coração que se sente machucada e maltratada e que deseja ficar no controle e colocar algumas condições entre mim e a pessoa a qual sou solicitado a perdoar.

Um dia descobri estas advertências do apóstolo Paulo aninhada entre muitas outras em Romanos 12. Aborrecei o mal, alegrai-vos, sede unânimes, não sejais sábios em vós mesmos — e a lista prossegue. Então aparece este versículo: "Não vos vingueis15 a vós mesmos, amados, mas dai lugar a ira, pois está escrito: Minha é a vingança; eu retribuirei, diz o Senhor".

Finalmente, entendi: em última análise, o perdão é um ato de fé. Perdoando outra pessoa, estou confiando que Deus é um juiz melhor do que eu. Perdoando, abandono meus próprios direitos de me vingar e deixo toda a questão da justiça nas mãos divinas. Deixo nas mãos de Deus a balança que deve pesar a justiça e a misericórdia.

Quando José, finalmente, chegou ao ponto de perdoar seus irmãos, a dor não desapareceu, mas o fardo de ser o juiz se desfez. Embora o mal não desapareça quando perdôo, ele perde o seu poder sobre mim e é assumido por Deus, que sabe muito bem o que fazer. Tal decisão envolve risco, naturalmente: o risco de Deus não lidar com a pessoa como eu gostaria (o profeta Jonas, por exemplo, ressentiu-se porque Deus foi mais misericordioso do que os ninivitas mereciam).

Eu nunca achei que o perdão é fácil, e raramente o considero completamente satisfatório. As injustiças importunas continuam, e as feridas ainda doem. Tenho de me aproximar de Deus repetidas vezes, entregando a Ele os resíduos do que pensava ter-lhe entregue há muito tempo. Ajo dessa forma porque os evangelhos tornam clara a conexão: Deus perdoa minhas dívidas como eu perdôo meus devedores. O inverso também é verdadeiro: apenas vivendo na correnteza da graça de Deus encontrarei forças para reagir com graça para com os outros.

Um cessar-fogo entre os seres humanos depende de um cessar-fogo com Deus.

Henri Nouwen

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