quarta-feira, fevereiro 03, 2010

Eugene Peterson: Salvação


Tanto em Êxodo quanto no evangelho de Marcos, fica claro que não contribuímos em nada para nossa salvação. No entanto, somos convidados a participar. Na primeira metade do evangelho, pessoas de todo tipo são atraídas para junto de Jesus, experimentando sua compaixão, as curas, o livramento, o chamado, a paz. Vemo-nos implicitamente incluídos. Na segunda metade do evangelho, essa experiência de participação pessoal se torna explícita.

No centro do evangelho de Marcos há uma ponte entre os anos na Galiléia em que se narra a vida de Jesus e as últimas semanas em Jerusalém, concentradas em sua morte. Na verdade, essa ponte é estratégica para nos guiar a uma participação na salvação coerente com a vida e a morte de Jesus descritas por Marcos com tanto cuidado. Creio ser evidente que Marcos não era um jornalista escrevendo boletins diários das atividades de Jesus no século I. Também não era um publicitário tentando nos envolver numa causa com ambições históricas. Seu evangelho é a teologia espiritual em ação, uma forma de escrever que nos leva a participar do texto.



Marcos 8:27—9:9 é a passagem que serve de ponte, no centro do relato, entre as várias evocações de vida na Galiléia, ocupando simetricamente um lado, e a viagem resoluta a Jerusalém e a morte, ocupando o outro.

A passagem de transição é constituída de duas histórias. A primeira, o chamado de Jesus à renúncia enquanto ele e seus discípulos se dirigem a Jerusalém, fornece a dimensão ascética da salvação (8:27—9:1). A segunda, a transfiguração de Jesus no monte Tabor, fornece a dimensão estética (9:2-9).


As histórias começam e terminam com declarações acerca da identidade de Jesus como Deus em nosso meio: primeiro Pedro afirmando: "Tu és o Cristo" (8:29); depois, a voz do céu dizendo: "Este é o meu Filho amado" (9:7). Numa extremidade, o testemunho humano e, na outra, a atestação divina.

Antes de considerarmos essas duas histórias, desejo enfatizar a necessidade de mantê-las no contexto e ligadas entre si. O contexto é a vida e a morte de Jesus, aquele que revela Deus. Jesus é o tema do evangelho de Marcos. Fora de contexto, essas duas histórias dão espaço para inúmeras interpretações equivocadas. Não podem ser consideradas isoladamente. Não oferecem uma teologia espiritual pronta para ser explorada em nossos próprios termos.

Além disso, elas são organicamente ligadas. Não devem ser separadas uma do outra. São um ritmo de duas batidas numa única vida de salvação, e não duas formas alternativas de existir na história, de participar da obra salvadora de Deus na história. As histórias reúnem os movimentos ascéticos e estéticos, o "não" e o "sim" que trabalham juntos no cerne da vida de salvação. A participação na salvação, conforme esta é revelada em Jesus, exige o emprego apropriado e diferenciado dessas duas palavras: "não" e "sim".

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