Poucos romances se revelam tão ariscos à qualificações definitivas quanto esse econômico e elegante ‘Desonra’. Brilhante reflexão sobre o caos provocado pelas repentinas mudanças das relações sociais na África do Sul pós-apartheid, ‘Desonra’ também aponta para uma série de outras questões presentes no coração de qualquer sociedade e indivíduo – as difíceis exigências da velhice, a matizada relação entre homens e mulheres, o desencontro das gerações e seus impasses; a decadência da imaginação humanística, do erotismo; a tensão e contraste entre os valores urbanos e rurais, cujo pensamento ‘arcaico’ se mostra indiferente à ‘sofisticação’ do homem citadino. A personagem que ‘encarna’ (e sofre) essas contradições e acidentes é o inesquecível professor universitário David Lurie, repentinamente afastado de seu cargo por um estranho processo de assédio sexual, e que ‘foge’ de seus problemas mergulhando no coração rural de seu conturbado país em mudança. Ao final da leitura, Lurie sobrevive inteiro na mente do leitor: um homem comum, nem frágil nem forte, cujos instrumentais – seu intelecto, seus livros, seu ‘prestígio’ – relevam-se praticamente nulos para lidar com o mundo que o cerca, com a sucessão de problemas e desafios que, um após o outro, caem-lhe sobre a cabeça. Essa nova África do Sul, com sua falsa moral, com sua nova ética, que se modifica alheia à sua vontade e controle, parece até mesmo, quando não revela indiferença, alimentar um prazer em sua queda, acumular uma vitória mesquinha face sua desgraça, que se mostra não apenas sintomática, como inexorável e esperada.
vinicius jatoba
Desonra é um livro sobre o inevitável, a dor que nunca será curada, assim é Lucy tentando amar o filho do estupro do ódio, acobertando-se protegida nas mãos de que deixou ela viver a violência.
Como a dor da desonra de ser humano corre rápido, e só é sentida quando descoberta, será? O arrependimento não tem lugar num espaço onde não existe tempo para vestir máscaras, mas apenas para vestimenta da dor do dia.
This is Africa, um país de muitas refinações e provações, um continente que engloba a violência moderna do assédio até o mais ardil complô para um estupro coletivo, a Àfrica que pune ocidentalmente os vestígios e que ignora as violências mais arbitrárias.
A África tem se demonstrado o ponto de encontro entre o ocidente e o oriente, entre o moderno e o passado, e tudo segue para um denominador humano comum: a desonra da violência.
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