domingo, agosto 01, 2010

Paulo Brabo: 6 passos o que faria Jesus.

Paulo Brabo não plagiou o livro americano Em seus passos o que faria Jesus, o título do livro de Brabo não tem a famosa sentença o que faria Jesus agora, ele vai além, propõe um “novíssimo manual de conduta do seguidor de Jesus”, mas não um manual moralista de um jogo de causa e efeito, mas um manual mais afeito a Jesus de riscos e ganhos.

Na introdução o autor nos fala que “ seguindo esses seis passos muto simples você alcançará rejeição imeditada na terra e consagraçaão a médio prazo no céu. A pressa é sua”. Eis os seis passos propostos por Brabo:

 

  1. Viva a intolerância contra os religiosos
  2. Faça o que os outros não esperam
  3. Desfrute sem possuir
  4. Viva inteiramente inserido no seu mundo
  5. Permaneça disponível para o momento
  6. Sensualize a sua espiritualidade

Em  viva a intolerância contra os religiosos, o autor relembra que Jesus foi absolutamente intolerante para com os religiosos de sua época, crítica a evolução do cristianismo para aquilo que Jesus mesmo condenou

Nenhuma manifestação do cristianismo institucional dosnossos dias difere, em qualquer sentido importante, da inclinação geral do parágrafo acima. Os olhos do Rei permanecem reclamando seus direitos, absolutamente convencidos da primazia da sua condição. Os religiosos cristãos chafurdam em seus merecimentos, e oram descaradamente para extrair alguma prosperidade dos inimigos de Cristo ou reduzi-los à servidão – o que for mais imediato ou der mais prazer (e é naturalmente graças aos cristãos que cremos que essas duas últimas coisas andam juntas) (p. 12)

Conclui, dizendo que o desconcertante é que Jesus, ao mesmo tempo, que não tolerava os religiosos, batendo de frente contra o monopólio da religião por estes, tolerava muito os pagãos. Assim:

O alvo da nossa intolerância deve seroutro, o alvo que foi também o de Jesus: os que passeiam pelo mundo crendo ter o aval inequívoco e a credencial indelével do VerdadeiroDeus. Aqueles que, nas palavras de Paulo, estão persuadidos de serem“guias dos cegos, luz dos que se encontram em trevas, instrutores de ignorantes, mestres de crianças, tendo na lei a forma da sabedoria e da verdade” – mas que “ensinam os outros sem ensinarem a si mesmos”. (p. 16)

No segundo passo Faça o que os outros não esperam, Paulo Brabo continua sua jornada em busca daquilo que Jesus realmente faria hoje, o inesperado. Que sejamos como ele, inclassificáveis, lisos como peixe.

 

Há cristãos que seguem o Primeiro Passo e demonstram uma saudável intolerância contra os religiosos; um número incrivelmente menor segue Jesus em ser inesperado como ele foi. Não há catecismo ou Escola Dominical que nos ensine a sermos desbocados, independentes,provocadores e desarmantes como Jesus. (p.22)

Acredito que o autor quer deixar claro que não adianta apenas você proclamar que vive um cristianismo livre da religião, sem intolerância, mas não pratica a sua fé cristã. Não conformidade com os padrões leva a uma paralisia de ação por parte  de alguns, mas não parece que é isto Paulo Brabo defende.

Por outro lado, Brabo também se opõe ao crente fabricado em massa, que não pensa por si só, são formatados, inofensivos, dóceis e obtusos. A intolerância contra o monopólio da religião não pode significar passividade com o mundo. Não podemos ser uma “assembléia de bocós e não os subversivos que nossa vocação exigiria de nós”(p. 22).

O cristão não deve ter apenas sabedoria, deve ter também sagacidade. Ou melhor, a astúcia de uma serpente.

Para ser imprevisível é preciso ser esperto; para enxergar a armadilha sendo montada é preciso tarimba; para evitá-la é preciso jogo de cintura;para desarmar o seu adversário publicamente, sarcasmo e bom humor; para desmascarar o seu adversário diante dele mesmo, uma compassiva mas implacável inteligência verbal” (p. 23)

 

O terceiro passo é Desfrute sem possuir. Tendo falado sobre os aspectos religiosos e disposição de espírito, Brabo vai falar de dinheiro, a nossa verdadeira religião.

Os primeiros passos, embora imprevisíveis e portanto virtuosos, são essencialmente cosméticos e relativamente pouco exigentes. Tudo começa a se desequilibrar quando se fala em dinheiro, e Jesus demonstra não ignorar isso. Ele então fala em dinheiro o tempo todo. (p. 27)

continua, dizendo:

Provocativamente, como em tudo que fazia, Jesus acaba propondo que a esfera de Deus e seu imponderável domínio podem ser adequadamente comparados àquilo que associamos de forma mais imediata ao valor, ao desejo e à satisfação – não o sexo, não o amor, não o poder, mas o dinheiro (em que estão contidos os anteriores). A vida encontrada em Deus é apenas comparável à moeda que foi recuperada, à rês valiosa que se reencontrou: ao tesouro que por um lado vale todo investimento, por outro o requer. (p. 28)

A riqueza material para Jesus, segundo o autor, é uma contradição em termos, pois a única riqueza possível é a espiritual, contudo, Jesus está longe de um ascetismo, nos convida a desfrutar do material sem prendermo-nos a ele.

É um equilíbrio que nos parece paradoxal, mas Jesus no fim das contas está dizendo que o pobre e o frugal estão melhor equipados para desfrutar das boas coisas da vida – não em virtude de qualquer pureza inerente de coração, mas simplesmente porque a limitação da sua condição força-os a valorizar o momento, que é no fundo o quetodos tem. “Por mais empenhado que esteja, qual de vocês consegue adicionar meio metro à sua estatura?”

Para o rabi de Nazaré ser rico e ganancioso não é conduta especialmente corrupta ou perversa – está mais para o imbecil. Porque, ele ousa argumentar, correr atrás do material impede-nosjustamente de desfrutá-lo. (p. 29)

O dinheiro como idolatria é o alvo, abrir mão do que o dinheiro existe para epitomizar: a segurança e o poder. A ganância, segundo o autor, aparece no Novo Testamento como idolatria exatamente porque é essencialmente mentirosa –promete segurança e poder quando ambos são derramados sem qualquer critério ou pré-requisito por Deus.

É preciso não dobrar-se a Mamom, mas fazer uso descarado das riquezas a fim de fazer verdadeiros amigos (Lucas 16:9). É preciso usar o dinheiro sem ser usado por ele; extrair gozo do material sem ser desfigurado por ele. É preciso ser generoso como Deus, pobre como Jesus. Dar a César a ninharia que é de César, receber de Deus a abundância que é de Deus. (p. 31)

O quarto passo a seguir é o Viva inteiramente inserido no seu mundo, Paulo Brabo aqui retoma, primeiramente, o conceito da jornada do herói, que advém dos mitos culturais  que os filmes hollywoodianos usam na maioria de seus filmes. Onde a familiaridade é inimiga do crescimento, para que o herói seja um verdadeiro herói numa história,  deve se afastar de tudo aquilo que lhe é confortável e familiar e partir sozinho ou apoiado pelo mestre numa jornada para o crescimento individual. Seguindo nesta crença, acreditamos que aquele que deseja santidade deve ter como primeiro passo, o afastamento do mundo, de tudo que lhe for familiar.

Por definição a palavra santo quer dizer separado, singular, o santo não pode ter nada a ver com o mundo, contudo, as coisas não são assim tão simples em Jesus.

Pensando na narrativa em si, em busca de um antagonista para Jesus dentro dos Evangelhos, Brabo conclui:

Nos evangelhos, o antagonista de Jesus é João Batista. De todos que em algum momento da história se opõem a Jesus ele é o único que representa verdadeira autoridade; de todos que se atiram no caminho de Jesus querendo exercer sobre ele alguma infuência, é João Batista que, em seu recato, chega a corresponder – contrapor-se– a ele. (p. 36)

 

Em perfeita oposição a João, Jesus deixa claro que é sua proximidade do mundo, seu “não-afastamento”, a porção mais essencial da sua missão. Ele vence a tentação do deserto e segue percorrendo incessantemente as cidades, onde pode estar com as pessoas e submetê-las à sua mensagem, que é essencialmente sua própria pessoa. (p. 38)

 

João é o homem que se afasta do mundo para não deixar-se contaminar por ele. Jesus é o homem inteiramente inserido no mundo, inteiramente mergulhado nas complicações do dia-a-dia e nas preocupações e privilégios do homem comum.

Dos incontáveis paradoxos do cristianismo histórico, esse é mais um: historicamente, os cristãos ignoraram o exemplo de Cristo tornaram-se seguidores funcionais de João. O caminho de JoãoBatista é o caminho dos monges do deserto, das ordens religiosas, das rádios evangélicas; é o caminho do ascetismo, das regras estabelecida spara “fazermos diferença”; das abstenções, do recuo, do afastamento,da irrelevância, da exclusão e do preconceito.

O caminho de Jesus é o da inclusão, da presença, do abraço irrefletido e incondicional do mundo. É o caminho estreito que poucos trilham, a porta exigente pela qual poucos passam. (p. 39-40)

Brabo contrapõem duas posturas, uma de Jesus de inclusão social e outra de João de exclusão social, Jesus procura transformações de dentro para fora, seja no aspecto pessoal ou mesmo no social, ele  não nos ensina ao alheiamento ao mundo, mas há sermos um sal dentro das entranhas do mundo em seus miolos.

Jesus propõe, inconcebivelmente, uma espécie de santidade que não é definida pela exclusão, mas pela generosidade e pela liberalidade da presença. É dele a horrenda idéia original de distribuir abraços gratuitos – gratuitos no sentido de serem dados a quem,essencialmente, não os merece. Essa sua ousadia derruba para sempre a primazia da surrada santidade distanciada epitomizada em João Batista. Jesus demonstra, em seu modo de vida, que um caminho superior ao de achar-se melhor do que os outros pela exclusão é amar os outros pela inclusão. (p.41)

Ou, como conclui o autor:

A santidade do senso comum exige que nos afastemos da normalidade da experiência do dia-a-dia em favor da singularidadeda vida religiosa. O Filho do Homem nos convida, assombrosamente,a fazermos o trajeto oposto.

No quinto passo, Permaneça disponível para o momento, Paulo Brabo vai nos falar sobre a ditadura do Carpe Diem, da valorização do  consumo de coisas no tempo, da aquisição de memórias como sinônimo de felicidade, enfim, da capitalização do tempo.  Em contrapontoa tudo isto, a valorização do real sentido do schabat:

o schabat, que representa uma completa reversão nas nossas expectativas convencionais sobre santidade: o schabat é demonstração de que para Deus existem menos lugares santos do que momentos santos.

O credo do carpe diem ou a idolatria do instante:

No credo do Carpe Diem, bem-aventurado é quem angaria no mais curto período a maior carteira de lembranças preciosas. Você já fez um cruzeiro pelo Caribe? Confere. Fez pós-graduação e mestrado? Confere. Já teve uma árvore e plantou um filho? Confere. Foi a um show de Antony and the Johnsons/ZecaPagodinho/André Rieu/Lagoinha? Confere.  Já passou o final de ano no Club Mediterranée? Quê? Não? Você ainda não viveu, cara – e não vai aparentemente chegar a viver, a não ser que tenha o rosário de lembranças corretas para ostentar. (p.46)

Concluindo:

“Jesus desconhecia nossa ambição por divertimento e por dinheiro; desconhecia também – o que é muitas vezes mais curioso– nossa síndrome de salvador do mundo. Ele fazia o que fazia,aquilo que o momento exigia, e não aquilo que queria ou achava que devia fazer. Fora morrer, o Filho do Homem não tinha plano algum:nenhuma agenda, nenhum prazo e nenhum cronograma; nenhum relatório, nenhuma reunião periódica de avaliação de resultados, férias nenhumas. Ele deixava que o momento fuísse e exigisse implacavelmente a sua pauta. “Basta a cada dia o seu mal” era para Jesus apenas outro modo de dizer “não vos preocupeis com o dia de amanhã”. Ele não perdia o momento de vista, pela excelente razão de que não queria perder Deus de vista”. (p. 51).

O último passo no caminho proposto por Paulo Brabo é de Sensualize a sua espiritualidade.  Ou, no dizer do autor, os últimos serãos os primeiros:

Em primeiro lugar, que a pessoa que se deparava com Jesus nos seus dias “mortais” não era impactada de qualquer modo direto ou natural pelo teor desses passos. São necessários observação e algum treinamento intelectual para abstrair-se a partir do que sabemos do comportamento de Jesus fórmulas gerais como “faça o que os outros não esperam” (segundo passo) e “viva inteiramente inserido no seu mundo” (quarto passo). E Jesus, como se sabe, impactou de forma transformadora gente que teve muito pouco tanto de uma coisa quanto de outra: pessoas pouco instruídas e pouco armadas de recursos intelectuais, muitas das quais estiveram com ele por pouco mais do que alguns minutos. (p. 56)

Paulo Brabo coloca que os passos apresentados por ele são abstrações, meras tentativas intelectuais de representar a realidade, como são uma forma de teologia, também os são limitados, contendo em si mesmo a semente da contradição- pois não há nenhum mérito no conhecimento intelectual e que o acesso ao favor de Deus não depende de modo algum dele. Para não ficar nesta limitação, Brabo acredita que se deve retomar o cerne do caráter de Deus nos evangelhos – Jesus tocou gente- devemos sensualizar nossa espiritualidade.

É preciso que passemos a procurar a espiritualidade no mundo sensorial, no mundo real, o mundo da experiência e dos sentidos. É preciso que passemos a ver nosso relacionamento com Deus e nossa participação no seu Reino como algo que diz respeito ao que é palpável e material, ao mundo da pele, da carne e do sangue. (p. 57)

A nossa espiritualidade não pode ser uma forma de disfarce que vivemos na carne, devemos aprender com Jesus que Deus se fez carne, aprender com ele como se vive e mostrar a sua desenvoltura. A carne, claro, é embaraçosa, somos sujeitos à doença, à fome, à solidão, etc. Para escapar deste fastio, usamos a espiritualidade para forjar uma demonização do nosso corpoe seus embaraços, e pregar que Deus só pode ser alcançado em esferas superiores da mente, fora da realidade, de preferência de olhos fechados e com privação de sentidos.

Jesus não ignorava os embaraços da doença, da fome, da dor, da solidão, da decrepitude, da morte, do ciclo digestivo; muitos desses atingiram-no em cheio na própria carne. Ao contrário de nós, no entanto, Jesus não buscava refúgio dessas coisas num mundo dos espíritos à prova de constrangimentos. Ele não caía na tentação da espiritualidade convencional e isso, aparentemente, é o que mais teimamos em não aprender com ele.

Jesus fazia o trajeto precisamente contrário ao nosso, avançando com galhardia em direção à experiência dos sentidos, tendo dedicado a maior parte de sua atividade neste mundo ao esforço de minimizar os constrangimentos produzidos em pessoas de carne pela fome, pela doença, pela dor, pela decrepitude, pela solidão. (p. 58)

Segundo o autor, pode parecer escandaloso, mas, Jesus estava primeiro tratando os corpos e depois os espíritos.

Nossa satânica fantasia como cristãos é passarmos pelo mundo à margem de todas essas coisas, desencarnados como fantasmas, vivendo momentos de espiritualidade em número suficiente para redimir os constrangimentos que nos impingem o corpo e os sentidos. Não queremos de modo algum enfrentar o terrível embaraço de que somos feitos de carne e osso. (p. 59)

Buscando escapar daquilo que a Bíblia não esconde em página alguma, que a carne essencialmente é animal, mesmos avançados na comunhão divina, somos animais tais quais uma barata. Paulo Brabo coloca duas grandes facções ou respostas para este escandâlo de que Deus se fez carne, judaica e romana-grega.

Na resposta romana-greca, o escandalo não era a expiação, nem a ressureição, o impensável era o corpo físico de Jesus ter sido redimido, já que a matéria na visão grega é decaída, e somente o espírito é puro e  inefável.

Imbuídos dessa convicção, os atenienses ouviram muito interessados o discurso do Apóstolo no Areópago, até que Paulo mencionou a ressurreição do corpo – ponto em que perceberam que a doutrina daquele sujeito não merecia mais do que zombaria e desprezo.Aqueles esclarecidos atenienses, mais ou menos como nós, não criam que houvesse no corpo e na carne qualquer coisa com vocação à redenção ou à eternidade. (p. 61)

Já a resposta judaica para a encarnação, o escandâlo era ver Deus confinado aos limites de sua própria obra. E o que era pior, segundo o autor, era que este repudiava o ascetismo e abraçava o mundo dos sentidos com paixão.

A nossa resposta:

E que fazemos? Com recato estúpido, pecaminoso e contraproducente negamos hoje a carne de Jesus e a nossa. Os mesmos cristãos que recusam-se a admitir a possibilidade de descenderem do macaco não trazem à mente que Deus em Jesus conformou-se, disparatadamente, à condição de primata.

Queremos que as pessoas “conheçam Jesus” através da assimilação intelectual do nosso discurso, jamais pelo intercâmbio de caminhadas epelo choque custoso entre corpos. Não queremos de modo algum traficar com a carne, porque não queremos que Deus trafique através dela. Esquecemos, miseravelmente, que a natureza divina de Jesus não estava escondida na sua carne. Estava manifestada nela. (p. 62)

Somos constantemente ensinados sobre a importância de morrer  e ressuscitar como Jesus, mas – ai de nós – não há quem nos ensine a encarnar.

BRABO,  Paulo  Em 6 Passos o que faria Jesus:Novíssimo manual de conduta do seguidor de Jesus São Paulo: Garimpo Editorial, 2009

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