domingo, novembro 07, 2010

Otto Maria Carpeaux: Jacob Buckhardt


A guerra é o auge dessas convulsões que sacodem periodicamente a humanidade: as crises. Burckhardt é sobretudo o criador da noção moderna de crise, à qual se subordinarão todas as teorias posteriores.
A crise é a passagem das massas por um período de soberania; massas incapazes de compreender e de conservar o que foi, incapazes de conceber e de construir o que será. A crise é uma fase intermediária entre a democracia nascente e a democracia abolida, única época da democracia realizada; segue-se-lhe o despotismo, que restabelece a ordem, a ordem dos cemitérios, cemitério daquilo que não voltará nunca. Foi Burckhardt quem primeiro descreveu a hora decisiva, quando a crise explode: "Subitamente o processo subterrâneo evolve com terrível rapidez; evoluções que levariam, em outro caso, séculos a se realizarem, cumprem-se num mês, numa semana, como fantasmas. Soa a hora, e a infecção se espalha num instante, sobre centenas de milhas e sobre as populações mais diversas, que não se conhecem umas às outras... Aos protestos acumulados contra o passado juntam-se terrores imaginários, e à vontade de tudo mudar se junta a vontade de vingar-se dos vivos, em lugar dos mortos, os únicos inacessíveis" (pp. 168-171). Evitando os psicologismos fáceis, Burckhardt não se presta às generalizações de um Le Bon, como também a sua superior erudição histórica evita as teorias cíclicas de um Sorel. Burckhardt nem louva nem censura: comprova; mas notar-se-á nas suas palavras sobre os mortos, inacessíveis aos terrores do futuro, um suspiro de alívio.

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