segunda-feira, junho 27, 2011

Dietrich Bonhoeffer: Confissão e santa ceia

O PRÓXIMO, MEIO DA GRAÇA

Apesar das reuniões comunitárias, os cristãos têm ficado sozinhos, sem serem verdadeiramente parte de uma comunidade. A razão é porque mesmo eles estando prontos para serem partes de uma comunidade piedosa, a comunidade não permite nenhum pecador, assim são obrigados a esconder seu pecado de si mesmos e da comunidade. Muitos crentes ficam horrorizados quando descobrem em sua comunidade um pecador real. Por isto, optam por estarem a sós com o pecado, ao custo de vidas em mentiras e hipocrisia.

No entanto, a graça do evangelho -  embora, seja difícil de ser entendido pelo piedoso, que se coloca antes da verdade, ela lhe diz que você é um pecador, incurável, contudo, você pode chegar a Deus que te ama. Que quer você como é, sem necessidade que faça nada ou dê nada, quer a você pessoalmente, somente a você - Pv. 23,26-. 


Deus veio até você para te salvar, afirmando em você a verdade dele, que te liberta. Ante a Ele, não dá para ocultar-se, não serve para nada a máscara que usa diante dos homens. Ele quer nos ver como somos, para nos salvar. Já não temos necessidade de mentir a si mesmo e aos outros como se estivessemos sem pecado.  E dê graças a Deus que ele permitiu que você seja um pecador, porque Deus, ainda que se aborreça do pecado, ele ama o pecador.

Jesus Cristo se fez nosso irmão na carne para que nos uníssemos a Ele pela fé. Nele, chegou o amor divino pelo pecador. Diante dele, tem podido se manifestar os pecadores e assim receber ajuda. Ele quer derrubar todas as aparências, o evangelho coloca a miséria do pecador e a misericórdia de Deus.  Desta verdade, deveria viver a sua igreja, o Senhor concedeu poder de confessar e perdoar os pecados em seu nome. (Jo 20,23)

Por esta promessa, Cristo nos tem dado a comunidade e com elas, os irmãos, como meios da graça. O irmão ocupa, então, o lugar de Cristo. Já não necessito fingir diante dele, posso ser um pecador que efetivamente sou porque aqui reinam a verdade e a misericórdia de Jesus Cristo. Cristo se fez nosso irmão para nos socorrer, e desde então, através dele, nosso irmão se converte para nós em Cristo, com toda a autoridade do seu encargo, o irmão está diante de nós como um sinal da verdade e da graça de Deus. Nos é dado como ajuda, escuta nossa confissão em lugar de Cristo e guarda, como Deus esmo, o segredo de nossa confissão.

O convite à confissão com o irmão e receber perdão fraternal no seio da comunidade cristã é um convite para aceitarmos a graça de Deus na igreja.


A CONFISSÃO

A confissão faz possível o acesso a comunidade, o pecado quer estar sozinho com o homem, o separa da comunidade. Quanto mais sozinho, tanto mais destruidor é o poder do pecado, tanto mais sufocantes são suas redes, tanto mais desesperadora é a solidão. O pecado quer passar desapercebido, foge da luz. Gosta das penumbras das coisas secretas, onde envenena todo o ser. Na confissão, a luz do evangelho irrompe sobre as trevas e o fechamento do coração - Sl 107, 16-.

Se pode dizer que na confissão, o pecado perde definitivamente todo resto de auto-justificação. O pecador  se liberta, abandona todo o que há nele de mal. Permanecendo oculto o pecado separa da comunidade, confessado, o ajuda a encontrar a verdadeira comunhão fraterna em Jesus.

O que Bonhoeffer vem tratando até aqui é a respeito da confissão individual, o irmão serve não por si mesmo, mas por meio de Cristo, como válido para comunidade, em virtude da sua vocação. Assim, o crente se integra na comunidade pela confissão fraterna, não conhecendo mais a maldição do isolamento.

O ACESSO À CRUZ.

O autor continua dizendo que a confissão faz possível o acesso para a cruz, a raiz de todo pecado é o orgulho, a soberba. Querer viver apenas para si, que inflama todo o ser, espírito e carne.  A raiz do mal é querer ser como Deus, a confissão diante do irmão é uma terrível humilhação, dói e abate nosso orgulho. 


A cruz de Cristo, segundo Bonhoeffer, aniquila todo o orgulho, embora tenhamos medo de morrer publicamente como no Gólgota, na vergonha da confissão, a confissão nos introduz na verdadeira comunhão da cruz de Jesus e nos faz aceitar a nossa própria cruz, quebrantando a nossa carne  e nosso espírito, assim podemos reconhecer a cruz como signo da nossa salvação e paz. 


 A RUPTURA COM O PECADO.


Vimos que a confissão faz possível o acesso a nova vida, uma vez confessado e perdoado o pecado, a ruptura com o passado está consumada. Esta ruptura significa a conversão - 2Co 5,17.  Cristo tem realizado em nós, o novo nascimento. 


A confissão implica imitação.  O acontecimento do nosso batismo volta a produzir-se na confissão, passamos da escravidão das trevas ao reino de Cristo, esta é a boa nova, a mensagem feliz (Sl 30, 5).


O PERDÃO DE DEUS


A confissão se faz possível o acesso a certeza, unicamente a palavra de de Deus que julga e perdoa na cruz, podem faze-lo. Deus atua através do nosso irmão, há um rompimento do auto-engano e a certeza do perdão, pois aquele que confessa sabe que não está sozinho consigo mesmo, reconhece na presença do outro a presença mesma de Deus. 


A graça de poder confessar nossos pecados ao irmão evita os terrores do juízo final, pelo irmão, posso estar seguro já neste mundo da realidade de Deus, de seu juízo e seu perdão e assim como a presença garante a autenticidade da confissão dos meus pecado. Deus nos concedeu a graça de poder confessarmos uns aos outros para que estivessemos seguros de seu perdão.





CONFISSÃO DE PECADOS CONCRETOS


Bonhoeffer fala da necessidade de uma concretude na confissão, uma confissão generalizada não serve para nada mais que tornar os homens justificados por si mesmos. Ele sugere que uma confrontação com os dez mandamentos será a melhor preparação para a confissão, sem isto, há o perigo da hipocrisia. 


A confissão é um meio de que Deus se vale par oferecer sua ajuda ao pecador, Lutero dizia que é impossível imaginar um cristão sem a confissão fraterna, no Catecismo Maior, ele diz : "por isto, quando exorto os crentes a que se confessem seus pecados uns com os outros, os exorto simplesmente a serem cristãos". 


COM QUEM CONFESSAR-SE


Bonhoeffer fala de aspectos práticos, segundo a promessa de Jesus, todo cristão pode converter-se em um confessor de seus irmãos. Para o crente que vive debaixo da cruz e que tem reconhecido nela o abismo de impiedade do coração humano e do próprio coração, nenhum pecado pode ser-lhe já estranho, quem se mortificou com o próprio pecado na cruz, não pode se espantar ante os pecados dos outros por mais graves que sejam.


Através da cruz, conhecemos o coração humano, a imensidade da sua perdição, seu veneno e extravio, também conhecemos o preço da graça e da misericórdia que nos devolveu a Deus, e também sabemos que apenas o crente que permanece debaixo da cruz pode receber nossa confissão.



Bonhoeffer faz uma comparação com a psicologia, ante a eles, sou um enfermo, mas diante dos irmãos, me está permitido ser um pecador.

O contato diário e profundo com a cruz despoja o cristão tanto do espírito humano de juízo como da indulgência, dando-lhe em troca uma atitude de severidade e de amor conforme o Espírito de Deus. Diariamente o crente passa pela experiência da morte e ressurreição do pecado, justificado pela graça. Somos empurrados a amar nossos irmãos com o amor e a misericórdia de Deus, que através da morte, conduz o pecador a uma nova vida.


Quem vive debaixo dessa cruz é que pode ouvir nossa confissão, ela surge por si mesma da pregação da cruz.


O PERDÃO DOS PECADOS


A comunidade cristã  que pratica a confissão deve guardar-se dos perigos, o primeiro é designar um confessor para toda a comunidade, o segundo é que se guarde de fazer da confissão uma obra piedosa no sentido religioso barthiano, isso seria uma maneira impúdica, estéril e abominável de entregar seu coração, é a confissão considerada como obra meritória, 




A COMUNIDADE EUCARÍSTICA



A confissão embora em si mesmo seja uma ação completa, tem como objetivo especial preparar a igreja para participar da santa ceia, reconciliados com Deus e com os homens, os crentes  estão prontos para receber o corpo e sangue de Jesus.

Ele exige que nos cheguemos ao altar sem estar reconciliado com os irmãos, para recebermos juntos a graça de Deus por meio do sacramento é necessário que os crentes tenham se destituído de todo fermento de cólera, maledicência e hostilidade que haja entre eles.

O convite para a confissão fraterna é dirigida para todos que o pecado tem submergido e que buscam a certeza do perdão, o perdão do perdão dele agora se manifesta na comunidade cristã pela presença decisiva de seu Senhor.

Bonhoeffer defende um tempo de preparação para a santa ceia, um período de  exortação, consolação e oração e assim o dia da santa ceia será uma festa para a comunidade cristã, reconciliados plenamente com Deus e com os irmãos, os crentes recebem o presente do corpo e do sangue de Jesus, o perdão, a vida nova e a bem-aventurança eterna. A comunidade eucarística é o vínculo que une os fiéis que permanece na eternidade, a vida comunitária dos cristãos que vivem debaixo da autoridade das Escrituras encontra no sacramento sua plenitude.

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