domingo, janeiro 01, 2012

Marcos 8: A volta



De volta ao Evangelho de São Marcos, no capítulo 8 é um ponto de transição, é quando os discípulos, finalmente, começam a entender quem é aquele que estão seguindo.

 E saiu Jesus e os seus discípulos para as aldeias de Cesaréia de Filipe; e, no caminho, perguntou aos seus discípulos, dizendo: Quem dizem os homens que eu sou?  E eles responderam: João Batista; e outros, Elias; mas outros, um dos profetas. E ele lhes disse: Mas vós quem dizeis que eu sou? E, respondendo Pedro, lhe disse: Tu és o Cristo. E admoestou-os, para que a ninguém dissessem aquilo dele.  ( 8. 27-30)

Aqui Pedro está respondendo que Jesus é o ungido, que significa que Ele era o rei,  o rei sobre todos os reis, aquele que colocaria as coisas nos seus devidos lugares. Jesus aceita o título, contudo,imediatamente já deixa claro que ele não era o tipo de rei que eles estavam esperando.

 E começou a ensinar-lhes que importava que o Filho do Homem padecesse muito, e que fosse rejeitado pelos anciãos, e pelos príncipes dos sacerdotes, e pelos escribas, e que fosse morto, mas que, depois de três dias, ressuscitaria. E dizia abertamente estas palavras. E Pedro o tomou à parte e começou a repreendê-lo. (8.31-32)


A primeira declaração de Jesus era de que o Filho do homem deveria sofrer, aqui Jesus está de novo referindo-se a si mesmo como o Filho do Homem do profeta Daniel (7.13-14), aquele que viria com os anjos e colocaria o mundo em perfeita ordem.

O sofrimento não estava ligado a vida do Messias, havia o texto do Servo Sofredor em Isaías,mas, ele não era relacionado com a vinda do Messias, já que este iria vir para derrotar todo o mal e injustiça e fazer do mundo um lugar justo. Como Ele poderia derrotar o mal sofrendo? Isto parecia ridículo, impossível.

Jesus diz que ele deve morrer. Isto ofendeu a Pedro, que começou repreende-lo, porque o Rei haveria de morrer, ele tem que vencer e nunca ser derrotado, Pedro simplesmente não conseguia entender isto. Mas, Jesus diz que ele era o rei, mas ele não veio para viver, mas para morrer. Ele não estava ali para tomar o poder, mas para perder o poder. Não estava ali para governar, mas para servir. E este era o jeito como ele ia derrotar o mal e colocar as coisas no seu lugar.


Jesus não diz que ele poderia sofrer, mas sim que ele deveria sofrer. A palavra importava, significa uma necessidade, ele deveria sofrer, deveria ser rejeitado, deveria ser morto, deveria ser ressurrecto. Jesus não disse que ele veio para morrer apenas, ele disse que ele teria que morrer, isto era absolutamente necessário. O mundo não poderia ser renovado a menos que Ele morresse. Porque era tão necessário que ele morresse?


Uma necessidade pessoal.


Existe uma diferença entre amor verdadeiro e falso, no falso amor há uma condição, você ama uma pessoa enquanto ela preenche suas necessidades, contudo, no verdadeiro amor, seu objetivo é dar a si mesmo para que a felicidade da outra pessoa esteja completa, sua alegria está na alegria da outra pessoa, assim, não há condição. A grande constatação é que nenhum de nós é capaz de oferecer um verdadeiro amor porque nós precisamos nos sentirmos amados para que possamos oferecer este amor. Nós procuramos pessoas que nos afirmem, que amem a gente. Nós investimos nosso coração apenas quando nós sabemos que haverá algo em troca. 


Quando experimentamos o amor de Jesus em nossa vida, descobrimos um amor incondicional, ele não manipula a nossa vida, ele simplesmente ama a gente como a gente é, busca um relacionamento com cada um de nós.


Uma necessidade legal.


Quando alguém magoa você, nós sentimos como se aquela pessoa estivesse devendo algo para nós. Se nós perdoamos esta pessoa, ao invés, de fazer esta pessoa pagar o preço, nós absorvermos o pagamento em nós.  O verdadeiro perdão implica num sofrimento.


Se entendemos isto, nós descobrimos que Deus não poderia perdoar nossos pecados, a não ser através do sofrimento, ele mesmo teria que levar sobre si as ofensas que fizemos para ele, a culpa não pode ser lidada a não ser que alguém a pague.


Então, era necessário que Jesus morresse, pagasse o preço das nossas culpas.


Uma necessidade cósmica.


Jesus tinha que morrer, a morte de Jesus foi violenta, o escritor de Hebreus diz que se não houver derramamento de sangue, não há remissão do pecado - 9,22-. O termo sangue na bíblia significa a vida dada, a vida é o maior presente que pode ser dado neste mundo. Apenas dando a sua própria vida, poderia Jesus fazer o maior pagamento possível pelo débito do pecado. A morte de Jesus não apenas foi uma pagamento, mas também, uma demonstração. 


A cruz de Cristo revela os sistemas corruptos deste mundo, que servem a opressão e o poder ao invés da justiça e da verdade. Ao condenar Jesus, o mundo condenou a si mesmo. A morte de Jesus demonstra não apenas a falência deste mundo, mas também revela o caráter de  Deus e seu reino, a morte de Jesus não é um fracasso, mas se submetendo a morte como penalidade, ele quebrou aquilo que prendia a Ele e a nós. 


Quando Jesus foi para cruz e morreu por nossos pecados, ele venceu através da derrota, ele encontrou nosso perdão na cruz transformando os valores deste mundo. Na cruz, a glorificação do poder foi exposta e derrotada; os sistemas deste mundo foram derrotados.


Quando a morte, nosso último inimigo, perde seu poder, a pior coisa que o mundo pode fazer com você, é agora a melhor coisa que o mundo pode fazer. A morte o levará aos braços de Deus e fará você ser aquilo que você mais tem esperança.  Quando a morte não tem mais poder sobre a sua vida, você começa a viver não mais uma vida de medo, mas uma vida de amor.


Um novo tipo de Rei.


E, chamando a si a multidão, com os seus discípulos, disse-lhes: Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome a sua cruz, e siga-me.  Porque qualquer que quiser salvar a sua vida perdê-la-á, mas qualquer que perder a sua vida por amor de mim e do evangelho, esse a salvará.  Pois que aproveitaria ao homem ganhar todo o mundo e perder a sua alma?  Ou que daria o homem pelo resgate da sua alma? Porquanto qualquer que, entre esta geração adúltera e pecadora, se envergonhar de mim e das minhas palavras, também o Filho do Homem se envergonhará dele, quando vier na glória de seu Pai, com os santos anjos.  Dizia-lhes também: Em verdade vos digo que, dos que aqui estão, alguns há que não provarão a morte sem que vejam chegado o Reino de Deus com poder. 8.34 - 9.1

Já que eu sou um rei numa cruz, qualquer um que quiser me seguir deve carregar a sua cruz.  A palavra grega para vida aqui é psyche, isto, quer dizer a nossa identidade, nossa personalidade, aquilo que nos faz diferentes um dos outros. Jesus não está dizendo que ele quer nós perdemos nossas características próprias. Não, ele está dizendo não construa sua identidade em ganhar coisas neste mundo, do que vale o homem ganhar o mundo todo e perder sua própria alma? 


Em toda cultura, há coisas que devemos ter para sermos considerados como valiosos. Se você tiver isto, ou conseguir isto, então você será alguém e deixará um legado para sua família e filhos. 


Jesus está dizendo que isto não funciona, se você ganhar o mundo todo, isto não será o suficiente para satisfazer você. Não importa quantas vitórias você tenha, elas nunca serão suficientes. 


Pedro ficou furioso porque ele tinha sua própria idéia de como deveria ser o rei dos reis, deveria ser alguém que forçaria seu poder sobre todos. Mas, Jesus sabia que isto nunca seria o suficiente.  


Jesus não é apenas um rei entre outros, ele é um Rei numa cruz, e Ele convida a cada um de nós a tomar a sua própria cruz, morrer para o controle da própria vida, e entregar tudo a Ele.


Quando Jesus diz, que alguns que estavam ali não iria experimentar o gosto da morte antes que ver o reino de Deus vindo com poder,  eles entenderam que o reino de Deus começaria na fraqueza, na cruz, eles veriam o poder da ressurreição, e veriam a igreja multiplicar em amor e serviço e sua influência no mundo.


Para nós, o reino de Deus começa na fraqueza, em abrir mão de nossos direitos sobre a nossa própria vida, começa quando admitimos que nós precisamos de um salvador. Nós precisamos de alguém que preencha todas as necessidades e pague o preço do nosso pecado.  Isto é fraqueza,  Jesus começou na fraqueza, primeiro, se tornando homem, depois, indo até a cruz. E nós queremos Ele em nossa vida, nós devemos começar na fraqueza também. O reino começa aqui, e não termina aqui. Algum dia, Jesus irá voltar e fará todas as coisas novas, o amor vai triunfar totalmente,  e a vida triunfará sobre a morte.


Em Cristianismo Puro e Simples, Lewis diz:



O que acontece com Cristo e conosco é algo seme­lhante a isso. Quanto mais tiramos do caminho aquilo que agora chamamos de "nós mesmos" e deixamos que ele tome conta de nós, tanto mais nos tornamos aqui­lo que realmente somos. Ele é tão grande que milhões e milhões de "pequenos Cristos", todos diferentes, não se­rão suficientes para expressá-lo plenamente. Foi ele que os fez a todos. Ele inventou — como um escritor inventa os personagens de um romance - todos os homens di­ferentes que vocês e eu devemos ser. Nesse sentido, nos­sos verdadeiros seres estão todos nele, esperando por nós. De nada vale procurar "ser eu mesmo" sem ele. Quan­to mais resisto a ele e tento viver sozinho, tanto mais me deixo dominar por minha hereditariedade, minha criação, meus desejos naturais e o meio em que vivo. Na verdade, aquilo que chamo com tanto orgulho de "eu mesmo" é simplesmente o ponto de encontro de miríades de cadeias de acontecimentos que não foram ini­ciadas por mim e não poderão ser encerradas por mim. Os desejos que chamo de "meus" são meramente os de­sejos vomitados pelo meu organismo físico, incutidos em mim pelo pensamento de outros homens ou mes­mo sugeridos a mim pelos demônios. Ovos, álcool e uma boa noite de sono: eis aí a verdadeira origem da mi­nha decisão de beijar a moça sentada à minha frente na cabine do trem, decisão que, para fazer uma vênia a mim mesmo, considero pessoalíssima e maduramente refletida. A propaganda será a verdadeira origem de mi­nhas idéias políticas, que considero próprias e específi­cas. Em meu estado natural, não sou tanto uma "pes­soa" quanto gosto de pensar que sou: a maior parte da­quilo que chamo de "eu" pode ser facilmente explicada por outros fatores. E só quando me volto para Cristo, quando me entrego à personalidade dele, que começo a ter uma verdadeira personalidade minha.


fonte: KING´S CROSS : THE STORY OF THE WORLD IN THE LIFE OF JESUS - Timothy J. Keller




Nenhum comentário: